#TOLERÂNCIA 58 - A ESPERA E A PACIÊNCIA
Este é ainda o tempo da Paciência.
Por iniciativa da minha colega Paula Faia, esteve hoje na escola o dr. Vítor Madail Herdeiro, o autor do livro RARET - A Guerra Fria Combatida a Partir da Charneca Ribatejana (2021).
No resumo da tese de mestrado que deu origem ao livro, o autor escreveu assim:
"(...) Em 19 de dezembro de 1950, o embaixador dos EUA em Portugal foi recebido em audiência pelo Presidente do Conselho de Ministros Oliveira Salazar. A audiência tinha dois objetivos; por um lado, revelar às autoridades portuguesas os esforços realizados pelos EUA no combate à expansão do comunismo na Europa e, ao mesmo tempo, convidá-lo a participar dessa luta, autorizando a construção de um centro de retransmissão Radio Free Europe (RFE) em Portugal. Nenhuma documentação é conhecida sobre as conclusões daquela audiência, exceto um "Aide Memoire" elaborado na época. No entanto, desde a reunião inicial em São Bento, até a constituição da Sociedade Anônima de Rádio Retransmissão - (RARET), em 10 abril de 1951, cinco meses se passaram. A primeira retransmissão da RARET ocorreu em 4 de julho de 1951, dirigida à Checoslováquia.
A RARET tinha como objetivo retransmitir, a partir do Centro de Emissor da Glória do Ribatejo, as emissões da RFE, organização patrocinada pelo National Committee Free Europe (NCFE), fundado nos EUA em 1949, financiada pela CIA e pelos fundos angariados pela Cruzada pela Liberdade (Crusade for Freedom). A adesão das autoridades portuguesas à iniciativa americana colocou Portugal no epicentro de um combate hertziano, que envolveu os dois blocos ideológicos da Guerra Fria ao longo de quarenta e cinco anos. (...)"
Na escola, ele contou a história toda. Foi uma sessão muito interessante.
Já no período da conversa informal que sempre acontece numa escola após ser o conferencista anunciar o fim da apresentação, já os slides estão esquecidos na projecção que continua ligada, falou-se sobre «aqueles tempos» e «os tempos agora».
A minha colega Paula Faia, professora de História e directora de turma, sempre muito maternal para os alunos, foi dizendo à plateia, composta por alunos de duas turmas de História, como era a comunicação dela com o namorado há quarenta e poucos anos, à distância, um em Lisboa e o outro em Paris, com um deles nas velhas cabines telefónicas públicas e o outro à espera em casa da pessoa que tinha um telefone, fixo (e sem ecrã!), em casa, era naquele momento, de horas antes combinadas, ou a oportunidade da conversa ao telefone passava.
Espontaneamente, ela faz esta afirmação lapidar: «Passava-se mais tempo sem a necessidade de estarmos sempre contactáveis, não é? Não havia essa necessidade e as coisas realizavam-se na mesma, não é?»
É isso: viciámo-nos na necessidade de estarmos sempre contactáveis. O efeito mais trágico, dramático, é que a espera tornou-se-nos insuportável. Perdemos a paciência, ou melhor, não aprendemos a Paciência da espera. As nossas vidas parece que ganharam o absolutismo do aqui-e-agora, para além dele só existe o que vai acontecer no minuto a seguir, quer dizer, no fundo, nunca saímos do aqui-e-agora.
Tornou-se um estereótipo social dizer que para as gerações novas só há direitos, não há obrigações, tudo lhes deve ser servido a tempo e horas, logo que o querem, a isso têm direito, isso lhes é devido. Não, não é isso que quero discutir agora, o meu caminho não é esse.
Mais do direito a tudo terem direito, o que me parece que se distorceu na vida dos mais novos é a experiência humana — ao mesmo tempo vital e animal (quer dizer, é intrínseca à nossa própria natureza) — da espera, do que não é imediato. Quem é capaz da paciência da espera tem outra mundividência, tem outra maneira de estar no mundo, tem outra liberdade.
Curiosamente, isto de que se falou neste final informal toca directamente no que "acrescentei" aos perfis da Tolerância (ver apontamento #TOLERÂNCIA 56), que fala de que os alunos pedem tempo, que não se tenha pressa, que se façam pausas, que se vá mais devagar, que se espere por eles.
Ora, o que hoje ganhámos a oportunidade de lhes levar foi precisamente a de tomarem consciência, a desafiante consciência de que eles também têm de fazer a aprendizagem da espera, da pausa, do contrário da pressa; e não apenas de reclamar isso como um direito. Atenção! Direito esse que espero ter deixado claro no apontamento em que sobre isto escrevi lhes seja respeitado, concretizando as condições para que assim aconteça. Direi que, quem sabe, se trata de ajudar os mais jovens a libertarem-se da escravatura do imediatismo.
Lembro-me de há bem poucos anos um alunos vir ter comigo no final duma aula, com ar a um tempo aflito e desapontado, e dizer-me: «'Stôr', se calhar vou desistir deste sujeito monográfico e escolher outro...» «Então, que se passa?» «Escrevi-lhe, mandei um email ao meu sujeito monográfico, mas ele nunca mais me responde...» «Quando é que lhe escreveste?» «Ontem.» Lapidar, não é?
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