sexta-feira, dezembro 24, 2010

Natal de 2010 - poema terceiro

O poema que acrescento aos "meus" poemas de Natal é especialmente bonito.
É ainda mais encantador porque me chegou trazido com a "ternura prosseguida" pelas mãos da filha do autor, a minha querida colega Manuela Mota, que me dizia "cá vai o poema escrito pelo meu querido pai ;-)"

NATAL É COMO SE…
Fosse a festa construída
em tempo e espaço, muito embora
a memória persistisse revestida.

Natal é como se…
Em cada um de nós surgisse
a mão estendida,
no sentido de dar e receber:
não a esmola secreta e compungida,
ou o presente inscrito no dever,
antes a ternura prosseguida.


terça-feira, dezembro 21, 2010

Natal 2010 - poema segundo

A querida colega Manuela Mota apareceu numa reunião de avaliação com dois precisos livrinhos com poemas de Natal. De autores portugueses.
Deu-me a vertigem do Menino Jesus, perante a caixa dos segredos de Fernando Pessoa, e pensei em lhos tirar. Não foi preciso, ela passou-mos muito amavelmente para as mãos.
De um deles ainda estou a fazer cópia. É de seu pai, o senhor Arlindo Mota. Deles, do senhor Arlindo e do seu livrinho, falarei ainda antes do dia de Natal.
Agora aqui deixo o que, no meu entender, é o mais simples e mais mimoso dos poemas do outro livrinho, de David Mourão-Ferreira, "Cancioneiro de Natal", uma coletânea publicada há alguns anos. É um poema do avô para os netos. Por isso tinha de ser escrito com a alma e o entusiasmo incrédulo das crianças.

Ó David Ó Inês
Vamos ver o Menino
inda mais pequenino
que vocês


Vamos vê-lo tapado
sob o céu do futuro
com a sombra de um muro
a seu lado

Vamos vê-lo nós três
novamente a nascer
Vamos ver se vai ser
desta vez
David Mourão-Ferreira, 1981

quinta-feira, dezembro 16, 2010

O Natal não é ornamento: é fermento

Com este poema abro a época do Natal neste blogue, esperando que muitos mais outros se juntem.
Conheci-o pelas mãos do Acúrcio, irmão de tantos sonhos, entusiasmos e realizações, partilhados nessa enorme e mágica fornalha que é o espaço da escola Eça de Queirós.
O primeiro verso, sozinho, é já um poema, já não seria preciso ler mais nada.
Obrigado, mano!

O Natal não é ornamento: é fermento
É um impulso divino que irrompe pelo interior da história
Uma expectativa de semente lançada
Um alvoroço que nos acorda
para a dicção surpreendente que Deus faz
da nossa humanidade

O Natal não é ornamento: é fermento
Dentro de nós recria, amplia, expande

O Natal não se confunde com o tráfico sonolento dos símbolos
nem se deixa aprisionar ao consumismo sonoro de ocasião
A simplicidade que nos propõe
não é o simplismo ágil das frases-feitas
Os gestos que melhor o desenham
não são os da coreografia previsível das convenções

O Natal não é ornamento: é movimento
Teremos sempre de caminhar para o encontrar!
Entre a noite e o dia
Entre a tarefa e o dom
Entre o nosso conhecimento e o nosso desejo
Entre a palavra e o silêncio que buscamos
Uma estrela nos guiará

                                 José Tolentino Mendonça

quarta-feira, dezembro 08, 2010

Transmitir, passar o testemunho

A organização dos seis biliões está prestes a ficar ultrapassada, já estamos mesmo à porta dos sete biliões.
Os trabalhos, os vídeos desta fundação são mais valiosos que a riqueza contida em todas minas do mundo. Os testemunhos são impressionantes, os temas são atraentes e importantes.
Neste vídeo, espelha-se algum do mundo no que à educação e à transmissão cultural diz respeito.
Que aulas, que seminários magníficos e extraordinários poderão fazer-se a partir daqui!
Vamos a eles!

domingo, dezembro 05, 2010

Um pré-conto de Natal

Hoje, de manhã, quando entrei no supermercado com uma lista grande de legumes para comprar (já se me acabaram praticamente todos cá em casa) quase esbarrei com um expositor temporário de cartões de Natal. Todos da Unicef. Nas duas prateleiras mais perto do chão tinha bonequinhos de peluche e carrinhos (o jipe azul, com a cruz branca, da Unicef).
Já depois de me ter decidido a quantidade de cartões a comprar, e depois de ter optado pelos pacotes de seis em vez das caixas de dez (afinal, mais caras); quando estava a escolher os desenhos, uma senhora chegou-se ao expositor e pegou logo num dos bonequinhos. "Olha, e se for isto?..." Sem olhar, percebi, pela resposta, que estava a falar com a filha. "Eu acho que os meninos não vão gostar disso..." Eu continuava a escolher os desenhos dos meus cartões. O que ouvi a seguir fez-me decidir não olhar mesmo para o meu lado direito: "Azar o deles..." foi a reação da mãe. A frase saiu-lhe da boca com rudeza explosiva! Fez-se um breve silêncio, a filha estaria a pensar no que a mãe tinha acabado de dizer. Depois percebi que estariam a fazer uma compra para um qualquer projeto de ajuda a crianças institucionalizadas, fazê-las felizes numa festa de Natal. Pouco depois, a menina repetiu: "Eu acho que os meninos não vão gostar desses bonecos..." Desta vez a mãe já não respondeu nada. Acabou por se voltar para a filha e perguntou-lhe: "Qual dos bonecos é que gostas mais?" Veio-me à cabeça que o que a senhora agora tentava fazer era comprar a cumplicidade da filha, os meninos não gostariam, certamente, mas sempre poderia vir a dizer que tinha sido a filha a escolher, e, assim escudada na ingenuidade pura e oblativa das crianças, a perversidade da escolha - da sua escolha, escolha de mãe - ficaria "genialmente" disfarçada. A menina continuou a ser muito mais lúcida, honesta e companheira do que a mãe: "Eu gosto mais deste, mas já te disse mãe, os meninos não vão gostar..."
A mãe baixou-se, esticou o braço mais duas ou três vezes, a pegar em bonecos, e finalmente escolheu um: "Vai este..." E foram embora.
Não cheguei a ver se acabou por levar o que a filha tinha dito que tinha gostado mais ou não, fixei-me só nas vozes e não pude deixar de ver, pela visão periférica, os gestos e as movimentações dos corpos.
Só depois de se afastarem é que olhei os bonecos. Pelo seu preço, pareceu-me que seria uma prenda convidativa; e pensei que os bonecos não seriam assim tão desagradáveis para as crianças, fossem elas quais fossem, a quem as meninas se referia.
Mas não era isso que era o cerne da questão, eu sabia-o bem. O cerne estava naquele "azar", pelo que ele denunciava dos verdadeiros sentimentos da mãe; e pelos efeitos que comportamentos assim têm na progressiva (des)educação das crianças e na sua formação moral, social e solidária.
Neste episódio - significativo episódio - quem foi sincera, tolerante e dialogante, foi a criança! Que virá a acontecer a estes valores ao longo do seu desenvolvimento pessoal?...

quarta-feira, dezembro 01, 2010

O Primeiro de Dezembro, e a Restauração da Independência

Celebramos a restauração da independência, da soberania política.
Tantos anos passados, sabemos, pela história de outros povos (alguns tão próximos de nós, veja-se, por exemplo a Catalunha e o País Basco que sofrem, ainda hoje, o domínio que nós conseguimos rejeitar há tantos anos, ao que parece, até com a ajuda, mesmo que indireta, deles; outros, mais distantes geograficamente, mas de mim afetivamente tão próximos, como é o caso do Tibete), como a "santa liberdade" - que eu tanto gosto o Vitorino cantar no Hino da Maria da Fonte! -, é uma condição essencial ao bem-estar pessoal e social.
É claro que entendo a expressão "santa liberdade" em sentido lato, não num sentido estritamente religioso.
370 anos passados de dia tão importante na nossa História, se a soberania política é preciosa, a soberania económica, pelo contrário, é trágica.
A versão que aqui deixo do Hino da Restauração é a única que encontrei no Youtube com os versos do hino, não apenas a música.