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sábado, abril 07, 2012

No Sábado de Aleluia, a Páscoa de Agostinho da Silva


Quando fui, há uma semana atrás, à Biblioteca Municipal da Horta requisitar o “In Memoriam” de Antero de Quental, a solícita funcionária porfiou a procurá-lo mas não o encontrou. Desejosa de me ajudar, trouxe-me o “In Memoriam” de Agostinho da Silva. “Obrigado, não é este que eu quero, mas tenho muito interesse em levá-lo.” Que engraçado! Logo quando tinha acabado de pôr a atenção nas atas do Encontro em São Jorge sobre Agostinho da Silva! E trouxe mesmo o livro para casa!
Hoje, finalmente, dei-lhe um pouco de séria atenção. Li as contribuições de Pedro Agostinho da Silva, Maria Gabriela Agostinho da Silva Rodrigues, seus filhos; do meu querido colega e amigo Inácio Fiadeiro; de António José Saraiva, autor que leio com olhos de filho-coruja, tudo o que ele escreve é, para mim, antecipadamente notável; e calhou – pura coincidência, abrir na página do testemunho de José Hermano Saraiva, irmão do meu “pai-corujado”, ou “mãe-corujada”.
Por atravessarmos a época cultural-religiosa que atravessamos – a celebração da Páscoa – chamou-me a atenção que o filho Pedro fizesse questão de associar a “partida” (como ele se refere ao falecimento de seu pai) de Agostinho da Silva ao Domingo de Páscoa, em 3 de abril de 1994. “(…) do Restelo de onde os Navegadores partiram, detendo-se no dia seguinte, brevemente, na Igreja de Santa Maria de Belém, Mosteiro dos Jerónimos.”
Confesso que não sei se as coisas se passaram assim por vontade expressa de Agostinho da Silva, ou se porque os vivos lhe quiseram dedicar, em presença, um derradeiro simbolismo.
Fico com curiosidade em saber um pouco melhor porque aconteceram assim as coisas na partida de Agostinho da Silva – aliás, preciso de saber muito mais de muitas mais coisas de Agostinho da Silva – já que, noutra contribuição do In Memoriam, a do jornalista António de Sousa, é feita aparentemente (o texto está escrito entre aspas) a seguinte citação do Professor Agostinho da Silva, que nos mostra uma certa maneira de estar do autor acerca dos Descobrimentos Portugueses (quer dizer, não são de franca ou orgulhosa glorificação): [o feito extraordinário das Descobertas] “Sim, prejudicaram Portugal porque passou a ser fácil enriquecer: Bastava ir pilhar. Toda a gente que não queria fazer nenhum esforço de trabalho, resolveu mudar de vida e lançar-se a essa aventura dos descobrimentos, essa empresa estatal dos descobrimentos, e isso levou aqueles que ficam em Portugal a viver daquilo que colhíamos lá fora, portanto a não tomar aqui nenhuma iniciativa”.
Quando calhei no depoimento de José Hermano Saraiva, lá estava a Páscoa outra vez! Num texto de 3 linhas, hiper-sóbrio, denunciando, no meu entender, o simples esforço de “cumprir um dever”, o mais conhecido divulgador da História de Portugal, anos a fio, na televisão portuguesa, insinua um mistério, um simbolismo religioso que, creio, Agostinho da Silva nunca encomendaria: “Se Agostinho da Silva pudesse comentar a sua morte, diria que esta ocorreu num Domingo de Páscoa, o dia da Ressurreição. Quando um pensador morre, a morte passa a ser ilusória. Ficam as sementes do pensamento.” Pergunto-me se noutro dia qualquer do ano não ficariam, do pensador, as sementes do pensamento. O misticismo – o dia da Ressurreição - que José Hermano Saraiva associa à morte do homenageado é o misticismo que o Professor Agostinho da Silva professava?...  Será que alguma vez Agostinho da Silva se tomou como um “eleito”, predestinado a alguma especial missão de condução dos homens, ressuscitando ao terceiro dia, como o Cristo celebrado há tantos séculos? E como “cola” este misticismo com o que cheguei a ver em alguns dos programas do Professor José Hermano Saraiva, em que me parecia ver uma pedagogia paciente para quebrar mitos e “ledos enganos” que distorcem a perceção, ou melhor, que alimentam uma certa perceção de nós próprios, os Portugueses, e da nossa História?a 

terça-feira, abril 03, 2012

Agostinho da Silva, a cultura, a educação e... a matemática

Na edição do ano passado da Semana do Mar da Horta, na ilha do Faial, comprei um pequeno livrinho, editado pelo FaiAlentejo, em 2006. Trata-se da publicação das atas do III.º CICLO AGOSTINIANO AÇORES, dedicado ao tema da Cidadania e Ambiente no Pensamento de Agostinho da Silva.
Só agora encontrei ocasião de ler este pequeno livro, e parece-me oportuno, agora que se volta a falar em reforma curricular do ensino primário e secundário, destacar duas ou três coisas da comunicação de Mário Cabral, "A 'Cidade de Deus' em Santo Agostinho de Portugal:

  1. A forte defesa, por vezes ingénua, do "bom selvagem", em contraponto com o mundo contemporâneo ocidental, nunca atinge, porém, o ponto de cegar o autor no que respeita à esperança depositada na revolução tecnológica que, no seu entender, funcionará como uma espécie de redenção da queda em que se encontra a Humanidade, espécie de círculo que se fecha e rosto que se encontra depois de se ter perdido.
  2. [como nota de rodapé, para explicar o que é o "bom selvagem"] TP II, "Educação em Portugal", 89-151, 92: "Acreditando, pois, que o homem nasce bom, o que significa para mim que nasce irmão do mundo, não seu dono e destruidor [...]".
  3. "[...] o professor deve sempre aparecer ao seu discípulo como uma pessoa de cultura perfeita; por cultura perfeita entenderemos tudo o que pode contribuir para lhe dar uma base moral inabalável, sem subserviências nem compromissos".
  4. "É esta a minha noção de cultura: tornar melhor a vida das pessoas. Começar pela alimentação, pelo vestuário, pela saúde, pelo ensino".
  5. Não se poderá jamais falar de cultura enquanto houver opressores e oprimidos. Agostinho da Silva é deveras sensível à condição infantil, mais até do que à feminina, escandalizando-se com o modo como a escola perverte a natureza do "bom selvagem", orientando-o para aquilo que chama ser civilizado. Cf. TP II, "Educação de Portugal", 89-151, 108.
  6. TEF II, "Pensamento em Farmácia de Província", 310: "[...] já que matemática é apenas uma parte do pensar e talvez o sonhar lhe seja muito maior".
(aversão integral do texto pode ser encontrada aqui:  http://www.jornaldepoesia.jor.br/A%20CIDADE%20DE%20DEUS.pdf)

quarta-feira, outubro 05, 2011

Dia Internacional do Professor, 2011

Na edição desta ano do Dia Internacional do Professor, proponho a leitura dos seguintes textos:

O primeiro é de um jovem do Canadá, de 15 anos de idade, lido no Dia Internacional do Professor, em 2002, nas Nações Unidas:
"What we need are good teachers who can get you to question yourself and what you know about the world, and who build communities in schools. Good teachers are what we need" (Nikki Sanchez-Hood, 15yrs, Canada)
(http://portal.unesco.org/education/en/ev.php-URL_ID=5217&URL_DO=DO_TOPIC&URL_SECTION=201.html)


O segundo tem a chancela do mestre Agostinho da Silva, que tive ainda a felicidade de conhecer pessoalmente e de o visitar em sua casa:
O Professor como Mestre
Não me basta o professor honesto e cumpridor dos seus deveres; a sua norma é burocrática e vejo-o como pouco mais fazendo do que exercer a sua profissão; estou pronto a conceder-lhe todas as qualidades, uma relativa inteligência e aquele saber que lhe assegura superioridade ante a classe; acho-o digno dos louvores oficiais e das atenções das pessoas mais sérias; creio mesmo que tal distinção foi expressamente criada para ele e seus pares. De resto, é sempre possível a comparação com tipos inferiores de humanidade; e ante eles o professor exemplar aparece cheio de mérito. Simplesmente, notaremos que o ser mestre não é de modo algum um emprego e que a sua actividade se não pode aferir pelos métodos correntes; ganhar a vida é no professor um acréscimo e não o alvo; e o que importa, no seu juízo final, não é a ideia que fazem dele os homens do tempo; o que verdadeiramente há-de pesar na balança é a pedra que lançou para os alicerces do futuro.
A sua contribuição terá sido mínima se o não moveu a tomar o caminho de mestre um imenso amor da humanidade e a clara inteligência dos destinos a que o espírito o chama; errou o que se fez professor e desconfia dos homens, se defende deles, evita ir ao seu encontro de coração aberto, paga falta com falta e se mantém na moral da luta; esse jamais tornará melhores os seus alunos; poderão ser excelentes as palavras que profere; mas o moço que o escuta vai rindo por dentro porque só o exemplo o abala. Outros há que fazem da marcha do homem sobre a Terra uma estranha concepção; vêem-no girando perpetuamente nos batidos caminhos; e, julgando o mundo por si, não descobrem em volta mais que uma eterna condenação à maldade, à cegueira e à miséria; bem no fundo da alma nenhuma luz que os alumie e solicite; porque não acreditam em progresso nenhuma vontade de melhorar; são os que troçam daquilo a que chamam «a pedagogia moderna»; são os que se riem de certos loucos que pensam o contrário.
Ora o mestre não se fez para rir; é de facto um mestre aquele de que os outros se riem, aquele de que troçam todos os prudentes e todos os bem estabelecidos; pertence-lhe ser extravagante, defender os ideais absurdos, acreditar num futuro de generosidade e de justiça, despojar-se ele próprio de comodidades e de bens, viver incerta vida, ser junto dos irmãos homens e da irmã Natureza inteligência e piedade; a ninguém terá rancor, saberá compreender todas as cóleras e todos os desprezos, pagará o mal com o bem, num esforço obstinado para que o ódio desapareça do mundo; não verá no aluno um inimigo natural, mas o mais belo dom que lhe poderiam conceder; perante ele e os outros nenhum desejo de domínio; o mestre é o homem que não manda; aconselha e canaliza, apazigua e abranda; não é a palavra que incendeia, é a palavra que faz renascer o canto alegre do pastor depois da tempestade; não o interessa vencer, nem ficar em boa posição; tornar alguém melhor — eis todo o seu programa; para si mesmo, a dádiva contínua, a humildade e o amor do próximo. (Agostinho da Silva, in 'Considerações')

A terceira proposta de leitura vem do meu grande mestre e amigo João dos Santos:
[Renúncia ao educador perfeito]
A minha formação como homem e a minha carreira como profissional, devo-a tanto às interferências positivas dos meus educadores e mestres, como, sobretudo, aos erros educativos que eles cometeram para comigo. Aprendi por intuição e experiência na vida que as atitudes erradas são tão válidas em educação como as atitudes corretasO educador em que me tornei renunciou há muito à crença mágica do educador perfeito, como o profissional que sou renunciou a esconder a ignorância com a erudição. Aprecio, portanto, os homens mais por aquilo que são (para o meu sentir) do que por aquilo que dizem.
Texto não revisto pelo autor(João dos Santos, in "Ensinaram-me a ler o mundo à minha volta", Assírio € Alvim, p. 306)