Mostrar mensagens com a etiqueta dinheiro. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta dinheiro. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, julho 16, 2015

Capitalismo, Imperialismo e a Loucura Cega das Teorias dos Jogos

À boleia do texto de Francisco Louça, publicado na edição do Público de hoje,
transcrevo para aqui a citação de Charles Péguy que serve de mote ao texto de Louçã, e junto-lhe outra citação de Péguy.
Curiosamente, ou absurdamente, ou significativamente, Péguy morreu nos campos de batalha da 1.ª Grande Guerra, precisamente despoletada, em última instância, pelo imperialismo alemão da altura.
Passaram 100 anos... A História repete-se?... O idealismo de Péguy é, de alguma forma, encarnado hoje por Tsipras ou Varoufakis?...

Em “L’ Argent” (1913), Péguy escreve:

“Conhecemos, tivemos contacto com um mundo (desde crianças), em que um homem condenado à pobreza estava pelo menos seguro na pobreza. Era uma espécie de contrato não-dito entre o homem e o destino e, antes do início dos tempos modernos, o destino nunca renegou este contrato. Estava entendido que os que se tivessem perdido na extravagância, no capricho, os que jogassem, os que quisessem escapar da pobreza, arriscavam tudo. Como jogavam, podiam perder. Mas os que não jogavam não podiam perder. Não poderiam suspeitar que viria um tempo, que já aí estava – e isto, precisamente, são os tempos modernos – em que os que não jogam perdem sempre, mesmo com mais certeza do que os que jogam.”
«Nous avons connu, nous avons touché un monde, (enfants nous en avons participé), où un homme qui se bornait dans la pauvreté était au moins garanti dans la pauvreté. C'était une sorte de contrat sourd entre l'homme et le sort, et à ce contrat le sort n'avait jamais manqué avant l'inauguration des temps modernes. Il était entendu que celui qui faisait de la fantaisie, de l'arbitraire, que celui qui introduisait un jeu, que celui qui voulait s'évader de la pauvreté risquait tout. Puisqu'il introduisait le jeu, il pouvait perdre. Mais celui qui ne jouait pas ne pouvait pas perdre. Ils ne pouvaient pas soupçonner qu'un temps venait, et qu'il était déjà là, et c'est précisément le temps moderne, où celui qui ne jouerait pas perdrait tout le temps, et encore plus sûrement que celui qui joue.»

Under Creative Commons License:Attribution Non-Commercial No Derivatives)

No mesmo texto, diz Péguy:
"Pela primeira vez na história do mundo, as forças espirituais foram reprimidas todas juntas não pelos poderes materiais, mas por um único poder material que é o poder do dinheiro . E para ser justo, deve-se mesmo dizer: Pela primeira vez na história do mundo todas as forças espirituais juntas, e no mesmo movimento; e todos as outras forças materiais juntas, e no mesmo movimento, que é o mesmo, foram reprimidas por uma única força material que é o poder do dinheiro. Pela primeira vez na história do mundo todas as forças espirituais juntas, e todas as outras forças materiais juntas, e num único movimento, e no mesmo movimento, foram afastadas da face da terra. E como uma imensa linha, essas forças foram afastadas em toda a linha. E pela primeira vez na história do mundo o dinheiro manda sem limites e sem medida. Pela primeira vez na história do mundo o dinheiro é o único face a face com o espírito."
«Pour la première fois dans l’’histoire du monde, les puissances spirituelles ont été toutes ensemble refoulées non point par les puissances matérielles mais par une seule puissance matérielle qui est la puissance de l’’argent. Et pour être juste, il faut même dire : Pour la première fois dans l’’histoire du monde toutes les puissances spirituelles ensemble et du même mouvement et toutes les autres puissances matérielles ensemble et d’un même mouvement qui est le même ont été refoulées par une seule puissance matérielle qui est la puissance de l’argent. Pour la première fois dans l’’histoire du monde toutes les puissances spirituelles ensemble et toutes les autres puissances matérielles ensemble et d’’un seul mouvement et d’’un même mouvement ont reculé sur la face de la terre. Et comme une immense ligne elles ont reculé sur toute la ligne. Et pour la première fois dans l’’histoire du monde l’’argent est maître sans limitation ni mesure. Pour la première fois dans l’’histoire du monde l’’argent est seul en face de l’’esprit.»

terça-feira, junho 23, 2015

A Crise de Fernando Pessoa exactamente há 100 anos atrás

Pois é, exactamente há 100 anos atrás Fernando Pessoa estava à rasquinha de dinheiro, coitado!...
No dia 23 de Junho de 1915, ele escreveu a seguinte carta a Armando Côrtes-Rodrigues (1):

Lisboa, 23 de Junho de 1915.
               Meu caro Côrtes-Rodrigues:
É uma circunstância violenta e aflitiva. V. pode emprestar-me cinco mil réis até ao dia 1
Armando Côrtes-Rodrigues
do mês que vem (1 de Julho)? É aflitivíssimo
[sim, é isso mesmo: aflitivíssimo] o caso, creia. E o pagamento é pronto e certo no referido dia 1, se não for antes, o que pode acontecer, mas não prometo.
Se v. me pudesse fazer isto! Valia-me numa conjuntura em que não tenho ninguém para quem me vire. Era questão de uns dias; nem eu — desde o que v. já me explicou sobre a sua situação — lhe faria partida alguma, ou seria capaz de lhe dizer que lhe pagava em determinado dia, se me fosse impossível fazê-lo. Se v. puder, não deixe de me fazer isto!
Não estarei no escritório amanhã senão tarde. Mas, vindo v. cá e deixando-me em envelope a quantia, ser-me-á entregue fielmente quando eu chegue.
Não me julgue indelicado por lhe pedir, ainda por cima, que venha aqui ao escritório e, mais, dizendo-lhe que talvez eu não esteja. É que tenho coisas inadiáveis de que tratar e não poderia marcar horas e lugar mais conveniente onde encontrá-lo. Desculpe.
Veja se me pode fazer isto, sim? É só por estes 5 ou 6 dias. Decerto que poderá ser.
Seu mt.º am.º e grato
               F. Pessôa
Há registo que no dia 26 ele voltou a escrever ao amigo. Assim:
Noite de 26-6-1915.
               Irmão em pseudo:
Saberás que hoje, pelas 6 horas da tarde, inesperadamente, tudo se resolveu.
Eu nada já esperava, como sabias, e eis que de repente uma porta se abriu nas ocorrências, mesmo defronte do meu Desejo.
Um astro benéfico talvez transitando um ponto vital do horóscopo? Verei se assim foi. Saúdo-te.
                Fernando Pessôa
Segundo a nossa fonte, esta segunda carta alude «certamente, à resolução do problema de dinheiro que motivara a carta de 23 do mesmo mês.»
A fonte é o volume "Correspondência, 1905-1922", edição de Manuela Parreira da Silva, da Asírio & Alvim, 1999, p. 165-6.

Pronto, a crise financeira de Fernando Pessoa, ao contrário da nossa, foi de pouca dura; só que ele teve muitas crises assim...

(1) Noutra carta, de 24 de Fevereiro de 1913, a Álvaro Pinto,  Pessoa chama a atenção ao seu correspondente, que é Côrtes, não é Cortês.