terça-feira, janeiro 20, 2009

A eleição de Barack "Eidje" Obama

Sou um daqueles anónimos de todo o mundo que se congratula com a eleição de Barack Obama, hoje, como presidente dos Estados Unidos da América. Porque aparece à esquerda de George Bush, porque parece ter bom-senso e sentido de humanidade, porque parece ter na pele a sensibilidade dos pobres, dos discriminados, dos excluídos.
Mas, sem que o entenda porquê (apenas faço conjecturas, que resultam da minha sensibilidade pessoal, e dos meus quadros teóricos de referência para a abordagem dos fenómenos pessoais e sociais), não deixei de reparar - e lamentar - a censura implícita e a falta de afirmação de um sentimento de confiança no anúncio do homem que se preparava para fazer o juramento solene como presidente dos Estados Unidos da América: o "presidente eleito dos Estados Unidos da América" não se chamava Barack Hussein Obama. Afinal, o seu nome era Barack "heidje" [H.] Obama.
Que cultura, que ideologia são estas que inibem, logo no momento formal de apresentação ao mundo do presidente dos E.U.A., um dos seus nomes de família, que parece ficar envergonhado, censurado, vitimado já pela força dos acontecimentos do mundo?
(Numa brevíssima busca no site oficial de Obama,  parece que o nome Hussein também aí  é já intencionalmente omitido)
No seu discurso de tomada de posse, Obama diz que o retalho das origens sociais da nação americana não são uma fraqueza, mas a sua força. E enumera cristãos, muçulmanos, judeus e não-crentes. Mas, no meu entender, a apresentação do nome deixou-se levar pela fraqueza, não foi o primeiro exemplo da força. Todos os outros "Hussein" dos E.U.A., naturalmente bons e respeitáveis cidadãos, não mereceriam da parte do bem recente Presidente dos E.U.A. um gesto de solidariedade, de afirmação da tal força do retalho social americano?
Senhor Presidente Barack Hussein Obama, o mundo - as pessoas e o ambiente - precisa que o seu mandato seja bem-sucedido. Desejo-lhe muita sabedoria. Desejo-lhe muita sorte.

sábado, janeiro 10, 2009

O segredo é amar

Hoje, assim que saí da piscina, vi lá ao longe, a começar a afastar-se da linha irregular do perfil dos telhados, a lua, magnífica!... Enorme!... Branca, a crescer em brilho.
Da piscina a casa pouco mais é do que uma centena de metros. Mesmo assim, cruzei-me com quem me perguntou pelo Jorge América.
Associei a lembrança do rapaz à lua magnífica que acabara de ver. Logo que cheguei a casa fui procurar um dos textos que sobre ele escrevi, já há alguns anos, em 1996. Aqui está:

O segredo é amar.”, disse um dia Sebastião da Gama. Matilde Rosa Araújo, na apresentação da obra do professor, do poeta, do peda­gogo, da obra com o mesmo nome “O segredo é amar”, escreve assim: (...)

Sebastião soube sempre desde menino, e nunca o desaprendeu - e todos o sabemos desde crianças, só o desaprendemos mais tarde - que o  segredo é amar.

Foi esse segredo natural que gritou a sua pedagogia de poeta e professor, segredo natural de vida que é o dos verdadeiros homens.

Viver para Sebastião foi amar. Amar numa dádiva total. (...)

A sua clara alegria era a transparência do homem sofredor: e Sebastião, numa Carta de Estremoz, explica-a: “Se me querem ver contente, é darem-me um sábado de Estremoz. Não que eu seja triste nos mais dias. O que eu amo e quanto bendigo, pelo contrário, este precioso bem de existir!

Dores, desgostos, bofetadas? Disso é feito o bem... Que coragem teria eu de ser feliz se na base de tudo, e a dar sabor e pureza à impura alegria, não esti­vessem bofetadas, desgostos, dores?”

Nestas bofetadas, desgostos, dores, não está, de forma alguma, uma pas­sividade negativa  do comportamento, uma aceitação do mal que um conceito de natureza religiosa podia fazer aceitar para sublimar. Deus para Sebastião era o “Cristo da moldura” fraterno e militante que com ele também sofre: a fé nunca lhe quis esconder os valores terrenos nem o seu significado dentro da própria vida. A convicção de que a vida física não é senão um mero estágio, e breve, não lhe tira a ternura e o encantamento perante o mundo e, também, não lhe entrega a rejeição de um mundo imperfeito que ele sabe que saudavelmente temos de tornar melhor.

Portanto, a sua alegria (e quem ainda o poderá julgar liricamente cego?) foi a alegria consciente de quem sabe que a vida só é vida quando actuante na responsabilidade maravilhosa, e tão raras vezes maravilhada, de nos sabermos vi­vos, de olhos, ouvidos e coração abertos.” 

         Assim como ele nos revela neste escrito:

Os meus vizinhos têm um bicho numa gaiola. Um pintassilgo. Pois se eu andasse zangado com a Vida, que não ando (apesar de tanto mal que me tem feito, há tantas coisas boas que a Vida dá e me dá!), era por causa do pintassilgo que me reconciliaria com ela. Com ela e com os homens - se eu andasse zangado com os homens... Era ao lusco-fusco. Frio como só cá no meu Estremozinho. Batem à porta, vou ver. Uma velhinha. “Ó senhor, o pintassilgo é seu? É para o recolher, que o animal apanha muito frio.”

Ó velhinha santa, velhinha dos livros! Naturalmente, se te estivesse à mão a gaiola, soltavas o pintassilgo. Mas o que pudeste fazer é tão grande! Não sabes duas letras, provavelmente. E ainda se persiste no erro de que a grande desgraça é não saber ler. Qual coisa! A grande desgraça é não saber que os pássaros têm frio.” 

         Ou - acrescento agora eu - a grande desgraça é não olhar para a lua e ver que ela é bonita.

         Mas tu, meu outro príncipe [referência a outros jovens de quem falara antes no texto], há bem pouco tempo, numa nestas noi­tes de Páscoa, em que a hora a que devias ter-te deitado já tinha passado há muito, foste também capaz de dizer-me, no pátio do Lar [o Jorge era um jovem institucionalizado], quando me cruzei contigo, a caminho do meu gabinete, e eu insistia para que fosses descansar:

         Descansar, ó Bigodes? Cala-te mas é tu com essas coisas de to­dos os dias e olha! Já viste bem a lua linda que está? Descansar é dormir ou é estar bem? E eu agora estou bem é a ver aquela lua! Garantes-me que ela amanhã está ali outra vez assim como está agora?

         Parei e pensei no que ele me estava a dizer. Ele tinha razão. Não me lembro de alguma vez ter visto a lua naquele dourado tão lindo. E esqueci-me outra vez das horas.

         Pensar que este príncipe teve seis a Filosofia neste último período!... Que raio de educação ou ensino temos nós, que fazemos dum jovem filó­sofo, espontaneamente de olhos abertos para o mundo, um aluno de Filo­sofia empobrecido e desalentado, que deve ir para a cama mais cedo!...

         Diz o profeta na Bíblia (Ecles. 32:3): “Fala, ancião, porque isso te compete; mas com discrição, não perturbes a música”.

         Pois falei. Talvez sem a discrição aconselhada. Perdoem-me. É hora de me calar.

terça-feira, janeiro 06, 2009

Os abraços, em Eça de Queirós

Ando a reler "A cidade e as serras" de Eça de Queirós.
Hoje de manhã, no breve momento de leitura matinal, ao virar da página 101 para a 102, da colecção Mundo de Letras, da Porto Editora, pude ler a seguinte passagem, feliz e oportuna coincidência com o apontamento de ontem:
Depois do banho e do chocolate, às dez horas, consolado e quentinho dentro do roupão de veludo, rompi pelo quarto do meu Príncipe, de braços abertos e sedentos:
- Oh Jacinto!
- Oh viajante!...
Quando nos estreitámos, fartamente, eu recuei para lhe contemplar a face - e nela a alma. Encolhido numa quinzena de pano cor de malva orlada de peles de marta, com os pêlos do bigode murchos [lá mais para trás no romance, o personagem Grilo, o "venerando preto" camareiro de Jacinto, dissera a Zé Fernandes: "- Sua Excelência sofre de fartura."], as suas duas rugas mais cavadas, uma moleza nos ombros largos, o meu amigo parecia já vergado sob o peso e a opressão e o terror do seu dia. Eu sorri, para que ele sorrisse:
- Valente Jacinto... Então como tens vivido?
Ele respondeu, muito serenamente:
- Como um morto.
Forcei uma gargalhada leve, como se o seu mal fosse leve:
- Aborrecidote, hem?
O meu Príncipe lançou, num gesto tão vencido, um "Oh" tão cansado - que eu compadecido de novo o abracei, o estreitei, como para lhe comunicar uma parte desta alegria sólida e pura que recebi do meu Deus!

segunda-feira, janeiro 05, 2009

Campanha FREE HUGS

Quem me conhece, sabe que isto, a espontaneidade do abraço, tem muito a ver comigo.
Se não tivesse, este vídeo está tão bonito que me tornaria imediatamente seu partidário fervoroso.
A versão que me foi enviada por e-mail, com outros personagens e situações equivalentes, e me ajudou depois a descobrir esta, acrescenta assim, no fim:
AIDS is not transmitted like this, but love is.
A SIDA não se transmite assim, mas o amor sim.
Together let's fight against discrimination.
Vamos lutar juntos contra a discriminação.

Free Hugs Campaign - Official Page (music by Sick Puppies.net)

domingo, janeiro 04, 2009

O Priolo - a ave mais ameaçada da Europa

Voltei ontem do Faial para Lisboa.
A revista de bordo do avião da TAP dedicava muitas páginas aos Açores.
É obrigação minha ajudar à divulgação da seguinte notícia lá publicada:
A ave mais ameaçada da Europa tem morada no Leste da maior ilha dos Açores [e para evitar a sua extinção é fundamental preservar a sua área vital [a floresta laurissilva, de distribuição limitada aos arquipélagos macaronésios: Canárias, Cabo Verde, Açores e Madeira]. (...) Reduzida a 600 indivíduos, a espécie é ameaçada pela vegetação exótica, como as conteiras e o incenso, que invadem a já de si reduzida floresta nativa.
Como ajudar?
Doar dinheiro para financiar projectos ou, se estiver de passagem por S. Miguel, dê um salto ao Nordeste e visite o Centro Ambiental do Priolo, conheça a exposição permanente dedicada à ave, envolva-se num projecto de voluntariado e ajude a limpar a floresta da Tronqueira de espécies exóticas, contribuindo para o equilíbrio do ecossistema local.

Visite aqui o Centro Ambiental do Proiolo.

quinta-feira, janeiro 01, 2009

Carta aberta ao menino prodígio de Setúbal, o Miguel Guerreiro

Querido Miguel,

Vou tentar que esta carta tenha o teu tamanho, que seja pequena.
Ontem, na noite de passagem de ano fiz questão de te ver no espectáculo da TVI. Tinha-te visto no fim-de-semana e tinha ficado impressionado com a tua performance a cantares o “Sol de inverno”.
Miguel, a tua voz é um dom. O teu corpo canta todo contigo. E quando a canção te puxa ao limite do esforço, e a boca se abre em toda a sua expansão, parece que a gente consegue ver-te a alma, feliz, a trazer-nos as canções de ti para nós, cantadas em modulações deliciosamente harmoniosas.
Não gosto do género de espectáculos em que participaste, nunca os vejo. Mas era a oportunidade de te voltar a ouvir – já que da primeira vez te ouvi por mero acaso - , e não quis perdê-la.
A minha sobrinha Mariana, ao meu lado, perguntava-me como era possível uma criança ter a voz assim. Ela tem 13 anos, quase 14. E se a tua voz irá ser sempre assim, tão bonita. Eu disse-lhe, entre outras coisas, que, por exemplo, terás de passar pelo risco da puberdade, não sabemos o que ela fará à tua voz.
O resto… o resto é motivação pessoal e educação familiar e escolar. Este teu grande sucesso, tão precoce, pode virar-se contra ti. Gostei de ver os teus pais no espectáculo. Fico a desejar que eles venham a ser contigo o que penso que eles deverão ser: que te protejam do sucesso fácil e dos gananciosos dos espectáculos mediáticos; e te proporcionem a formação pessoal e a educação escolar e artística que a tua pessoa e o teu dom necessitam.
Parabéns, Miguel!
Muito obrigado pelos momentos deliciosos que me proporcionaste!
Desejo-te tudo de bom na vida. Não é nada de especial, toda a gente diz assim. Mas também, na verdade, que mais posso eu desejar agora para ti?...