domingo, março 01, 2015

MORREU AMADEU FERREIRA.

MORREU AMADEU FERREIRA.
Acabo de receber esta tão triste notícia!...
Tive ainda o privilégio de o conhecer; e de lhe levar um pouco de alegria, quando ele soube o que, tropegamente, comecei a procurar fazer pela Língua e pela Cultura que ele tanto amava: o Mirandês.
A partir de agora só tenho de me esforçar em dobro no que decidi fazer; mesmo que tropece também em dobro! Conte comigo, Mestre Amadeu!
Aos seus filhos, a todos os familiares; e a todos os amigos, os seus e os meus, a quem a Língua Mirandesa me juntou, o meu mais fraterno abraço!
(a fotografia é de Carlos Ferreira, irmão de Amadeu Ferreira)

APENAS GRATIDÃO: MOTE PARA UMA ELEGIA
[...] foi desta gente que nascemos, solidária ainda que abandonada, culta ainda que analfabeta, forte mesmo velha e cansada, de uma dignidade que supera as montanhas com que sempre lutou; saudades? defesa do passado? são, que desde sempre a minha mãe me disse «tu nun quergas esta bida»: apenas gratidão me ocupa." (Norteando, 224-225)
A aguarela é de Manuol Bandarra, irmão de Amadeu Ferreira.

- Perdoa-lhe, pai, ele não sabe o que diz.

Assim que entrei na carruagem, no Metro do Saldanha, dei logo de olhos com ele: sportinguista da cabeça aos, a impecável camisola oficial e o cachecol que saúda e celebra os golos.
Encostei-me nas costas do banco do costume, ali aconchegado ao cantinho da porta que não abre, oposta à que usei para entrar. Peguei no livro, fresquinho, compradinho de manhã, de tema candente e leitura apetitosa.
Tocou um telemóvel, e como o som habitual do meu está alterado, reagi ao toque, dando-lhe atenção. Não, não era o meu; era o do jovem sportinguista; e era para falar do jogo entre o Sporting e o Porto, mais logo. Pelos curiosos e complexos caminhos da atenção difusa reconheço claramente a espantosa afirmação: "Se perdermos com o Porto, o resultado já não é mau..." Ainda tentava eu confirmar que tinha sido isso mesmo que tinha ouvido, já o mesmo rapaz desabafava: "Ao menos não tenho que aturar depois aqueles filhos da p*ta, se não forem campeões!..."
Pasmei!... Pasmei mesmo! Como é possível que o entusiasmo clubista seja feito destas "convicções"?...
- Perdoa-lhe, pai, ele não sabe o que diz.
O meu pai foi sempre um entusiástico adepto sportinguista; daqueles que se irritava, nas disputas directas, com as vitórias dos benfiquistas e dos portistas. Agora, consolar-se com as derrotas do seu clube do coração, mesmo que servissem os sucessos dos adversários mais difíceis?!... Nunca! Nunca!