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terça-feira, agosto 26, 2025

#TOLERÂNCIA240 - CONCURSO DE PIADAS INTERNACIONAIS

 #TOLERÂNCIA240 - CONCURSO DE PIADAS INTERNACIONAIS

Tenho na cabeça ainda a funcionar o automatismo de, chegado ao final de Agosto, começar a magicar actividades para os primeiros dias de aulas, daquelas que puxam a rapaziada para o fazer activamente mais do que escutar passivamente.

Hoje, saiu-me esta, numa primeira versão que ainda pode levar alguns retoques: um concurso de piadas internacionais.

1) Começo por pedir aos alunos que pensem em pessoas de 7 países europeus (sim, europeus, não apenas da União Europeia).

2) A seguir, peço-lhes que os ponham a contar uma anedota sobre alguém; e quero que me digam quem é que são os alvos (ou as vítimas) das anedotas que contam.

3) Registam-se as respostas no quadro; e comentam-se os resultados.

4) Apresento a minha lista: o português contou uma de alentejanos. O espanhol contou uma de galegos. O francês contou uma de belgas. O inglês contou uma de escoceses. O alemão contou… uma explicação de 40 minutos. O italiano gesticulou tanto que quase não precisou de falar. O grego disse: — «A minha piada é tão antiga que já está escrita nas paredes de um templo!»

5) Digo-lhes que a minha lista é feita com base nos estereótipos e preconceitos tradicionais atribuídos a cada uma das nacionalidades, as quais, por sua vez, estão entre aquelas que também mais imediatamente se associa o pensamento dos portugueses.

6) Seguir-se-á uma fase de discussão livre sobre o trabalho realizado.

7) Finalmente, entrego aos alunos uma lista de, digamos, aforismos. É para eles irem pensando aos longo das semanas, haverá depois um dia em que os estereótipos e os preconceitos serão o tema principal da aula. Nessa altura, voltaremos a este trabalho e ao 'têpêcê' que lhes deixei para irem ruminando.

8) É esta a lista dos aforismos:
a) A tolerância é a arte de rir com os outros, nunca dos outros. (N' "O Clube dos Poetas Mortos", na aula em que o professor Keating pede aos alunos que leiam os poemas que escreveram, comentando um deles, em que congratula um aluno por ter sido o primeiro a ter uma negativa na escala de Pritchard (a célebre escala de avaliação das obras poéticas falada no filme), ele diz: «We are not laughing at you, we are laughing near you.» [Não nos estamos a rir de ti, estamos a rir contigo, ao teu lado]
b) Um estereótipo é uma cela pequena para um povo inteiro; a tolerância é a chave que a desfaz.
c) Quem verdadeiramente conhece a sua própria cultura, pode sorrir perante o exagero alheio sem se perder nele.
d) A piada sobre o outro revela mais sobre quem a conta do que sobre quem a ouve.
e) A sabedoria está em distinguir o gracejo inofensivo, que une, do preconceito maldoso, que separa.
f) Rir-nos das nossas próprias caricaturas é o primeiro passo para desarmar a ignorância.

Estou contente com este projecto! Acho que tem bom potencial pedagógico. Correndo tudo como está previsto, deixarei a escola, e o ensino, no final de Setembro. Vou tentar fazer este exercício, nem que seja só por uma vez ainda antes de sair.

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segunda-feira, junho 16, 2025

#TOLERÂNCIA169 - A TOLERÂNCIA NA AVALIAÇÃO ESCOLAR

 #TOLERÂNCIA169 - A TOLERÂNCIA NA AVALIAÇÃO ESCOLAR

Estou a concluir a minha última acção de formação obrigatória para professores. Estou à beira de me reformar, mas ainda posso subir 1 escalão na carreira, e a subida está dependente da frequência com aproveitamento desta acção de formação.

O tema da acção de formação é a avaliação dos alunos. Hoje, terminadas as obrigações escolares, pus-me a preparar a minha participação na sessão de formação de amanhã (a última sessão síncrona) e lembrei-me de me meter à conversa com o ChatGPT acerca, precisamente, da avaliação e da Tolerância. A questão-gatilho foi a seguinte: «Avaliação dos alunos. Do ponto de vista da avaliação quantitativa, o que é ser tolerante na avaliação dos alunos? Responde em português de Portugal.»

O ChatGPT respondeu-me assim:

Claro!
Do ponto de vista da avaliação quantitativa, ser tolerante na avaliação dos alunos pode significar algumas coisas, sempre com o objectivo de garantir justiça, humanidade e compreensão do percurso individual de cada aluno, sem abdicar dos critérios de rigor. Em português de Portugal, podemos descrever assim:
1) Considerar margens de erro: admitir que um aluno pode, ocasionalmente, cometer pequenos deslizes que não reflectem necessariamente o seu real nível de conhecimento ou competências. Por exemplo,

não penalizar excessivamente por um erro isolado, desde que o essencial esteja correcto.
2) Atenuar o peso de avaliações pontuais: evitar que uma única má nota tenha um impacto desproporcionado na classificação final. A média ponderada de vários instrumentos de avaliação pode ser uma forma de praticar essa tolerância.
3) Reconhecer progressos e melhorias: dar algum peso ao progresso demonstrado ao longo do tempo. Se um aluno evidencia melhorias consistentes, a avaliação quantitativa pode reflectir essa evolução, mesmo que nem todos os resultados sejam elevados.
4) Flexibilizar critérios em situações justificadas: em casos de dificuldades pontuais devidamente fundamentadas (problemas de saúde, dificuldades pessoais, etc.), o professor pode ajustar o peso de determinadas avaliações ou permitir avaliações de recuperação.
5) Evitar avaliações “cegas” ou excessivamente mecânicas: ser tolerante implica ter em conta o contexto e não aplicar os critérios de forma inflexível, sempre dentro dos limites definidos pelas normas da escola ou instituição.

Resumindo:
Na avaliação quantitativa, ser tolerante é aplicar os critérios com justiça, ponderação e bom senso, reconhecendo o percurso e as circunstâncias dos alunos, sem perder o rigor, mas evitando rigidez excessiva.
Se quiseres, posso também dar exemplos concretos — por exemplo, numa prova escrita, num trabalho de grupo, ou em exames nacionais. Queres?

Eu quis, e fomos por ali fora. O ChatGPT construiu-me anúncios, tabelas, memorandos, listas, guias para professores...

Para aqui trago apenas algumas frases interessantes, que vou escrever por ordem cronológica de irem aparecendo nas respostas do 'chatbot':

a) «Tolerância não significa "dar a nota", mas sim aplicar o bom senso pedagógico na análise quantitativa dos resultados, com justiça e equilíbrio.»
b) «Se a tolerância for tão grande que se abdica dos critérios definidos (competências, conhecimentos, qualidade exigida), o resultado deixa de reflectir o verdadeiro nível do aluno.»
c) «Se o aluno é sempre beneficiado por uma avaliação demasiado tolerante, pode criar a ilusão de que está preparado, quando na verdade não está.»
d) «A Tolerância excessiva aplicada de forma desigual pode ser percepcionada como injusta por outros alunos.»
e) «Se um professor ou uma escola são sistematicamente demasiado permissivos, a credibilidade das classificações fica comprometida.»
f) «A exigência é também uma forma de respeitar o potencial dos alunos. Uma avaliação tolerante demais pode impedir o aluno de ser desafiado a melhorar.»

A certa altura pedi ao ChatGPT: «Sim, mostra como articular tolerância e rigor (estratégias práticas para o professor).»

g) «Explicar aos alunos o que se espera em cada avaliação: conteúdos, competências, qualidade de resposta. E distinguir o que é essencial (que não pode falhar) do que é acessório (onde se pode ser mais flexível).»
h) «Sempre que se aplica alguma tolerância, explicar ao aluno: o que foi valorizado; o que poderia ter sido melhor; o que deverá melhorar no futuro. Isto evita que o aluno confunda tolerância com ausência de exigência.»
i) «Ter consciência da distinção entre Tolerância sem rigor, rigor sem Tolerância e Tolerância com rigor.»
j) «A aplicação da tolerância não significa ser "simpático", mas sim ser pedagogicamente inteligente. Sempre ao serviço da aprendizagem duradoura e significativa.»
k) Finalmente diz que «A avaliação serve o processo de aprendizagem, não apenas a classificação. Tolerância não é facilitismo: é ponderação pedagógica. Rigor não é rigidez: é aplicação de critérios claros e consistentes.»
l) Para acabar mesmo, diz: «Aplicar tolerância sistemática: desvirtua o rigor. Ser excessivamente rígido: bloqueia o desenvolvimento. Não comunicar aos alunos o porquê das decisões: gera confusão e desmotivação. Mensagem final: o verdadeiro equilíbrio entre tolerância e rigor respeita o aluno, a aprendizagem e a seriedade do sistema educativo. Ser justo não é dar, é ajudar a conquistar.»

Um dos grandes desafios dos sistemas escolares (especialmente do nosso) é ser capaz de libertar os professores e os alunos do papão das avaliações, para que eles se possam dedicar mais plenamente ao que mais interessa, os motiva e os satisfaz: aos professores, é ensinar; aos alunos, é aprender.

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sábado, fevereiro 20, 2021

POLÍTICA E EDUCAÇÃO 8/52 - PIOR QUE A IGNORÂNCIA É A PRESUNÇÃO DO CONHECIMENTO

POLÍTICA E EDUCAÇÃO 8/52 - PIOR QUE A IGNORÂNCIA É A PRESUNÇÃO DO CONHECIMENTO

Com frequência idêntica, tenho participado neste mês de Fevereiro, em dois conjuntos de reuniões regulares, à distância, através da Internet.

No primeiro, que junta educadoras de infância e professores do ensino básico ao secundário, abordamos as temáticas do Género, da Igualdade e da Cidadania. As reuniões acontecem no âmbito das acções de formação profissional a que as educadoras e os professores estão obrigados a fazerem regularmente. O universo de participantes é o formado pelos profissionais da educação e do ensino sob a tutela do 
Ministério da Educação.

No segundo, que junta profissionais “psi” e afins, distribuídos por todo o mundo, conversa-se à volta dos temas da Saúde Mental e da Educação para a Saúde. São encontros de participação livre, com gentes de todo o Mundo. Já consegui identificar colegas de Espanha, França, Itália, Dinamarca, Polónia, Suíça, Argélia, Cabo Verde, Brasil, Martinica, México; e, naturalmente, Portugal.

Neste segundo grupo abundam os cabelos brancos e as cabeças já sem cabelos. São pessoas com muita experiência profissional, em instituições públicas, em acções de rua, em consulta privada. Percebe-se que são pessoas com muita experiência, que lêem muito, que estudam muito; e que estão naturalmente motivados para observarem as realidades concretas, distintas das suas próprias realidades — estão naturalmente motivados para conhecerem mais e melhor, e para aprenderem; até para escaparem ao sempre iminente risco de se conformarem ao que já sabem e mais cedo ou mais tarde faz as pessoas tomarem a nuvem por Juno. Nestas reuniões, a dinâmica é mesmo a da conversa, a da partilha, a da reflexão entre todos. Escuta-se e fala-se. Há uma sede serena de procura da informação.


No primeiro grupo, entretanto, a sensação por que sou tomado é outra. Dispondo o grupo de um recurso digital de comunicação à distância poderoso (de provas dadas ao longo de muitos anos de experiência e aperfeiçoamentos sucessivos), em que se torna possível a dinâmica síncrona e assíncrona da comunicação entre formadora e formandos; e a constituição de bancos partilhados de dados, informações e documentos, a comunicação está reduzida ao mínimo possível, exclusivamente síncrona, com comunicação quase exclusivamente unidireccional, a fazer lembrar intenções de endoutrinamento.

É precisamente este grupo que me impõe à consciência a imagem da ignorância e da presunção sábia. A presunção de que conhecendo uma árvore, a árvore singular, se conhece a floresta toda. É o primado do pensamento sincrético, insuficientemente informado, por isso, produtor de comportamentos desajustados, ambíguos, errados. Ora, na esfera da Educação, do ensino pré-escolar ao ensino universitário, em que as crianças, os alunos, os estudantes vão progredindo, crédulos e cheios de boa-fé na capacitação e na competência de quem os educa ou ensina, isto é perigoso… muito perigoso!

Num notável artigo publicado n’ “O Referencial” (edição de Out-Dez 2020, n.º 139) o Procurador-geral Adjunto Jubilado Pena dos Reis escreve que “o que ameaça o êxito do pensamento científico na sociedade é a extraordinária persistência e generalização do pensamento mágico”, identificando neste 3 níveis. O segundo nível, diz ele, “é aquele que cria modelos susceptíveis de poderem ser confirmados ou infirmados pela observação, mas que desvaloriza o papel desta (da observação) no processo de consolidação do que se pode afirmar como verdade."

Por seu lado, o Professor José Mattoso, na entrevista que o semanário Expresso publicou ontem, quando lhe perguntam «Há uma boa e uma má maneira de fazer a História?» ele responde: «Sem dúvida. Uma maneira má é esquecer a relação entre os factos e as suas causas ou consequências. Os factos não acontecem por acaso. Temos sempre de os medir, situar, contextualizar, atribuir a um sujeito. Só assim podemos fazer deles uma narrativa. Só assim podemos fazer boa História. Além disso, temos de respeitar os factos sem pretender julgá-los. Também não podemos pôr os factos (ou seja, a sua narrativa) ao serviço de uma causa, por melhor que ela seja.»

Podemos praticamente transpor na íntegra estas palavras da História para a Educação e o Ensino.

Sim, o pensamento sincrético, mal informado, que confunde a nuvem com Juno e faz da singular árvore a floresta inteira, é um perigo real que espreita hoje em dia, a todo o momento, a Educação e o Ensino.

Na mesma entrevista ao Expresso, perguntam ao Professor José Mattoso: «A Idade Média é a Idade das Trevas?» Ele responde: «O conceito de Idade das Trevas aplicado à Idade Média resulta de um equívoco ou de ignorância pura e simples. É verdade que a cultura medieval muitas vezes confundia magia e superstição com religião autêntica, e que via milagres e intervenções divinas um pouco por toda a parte. Mas não podemos generalizar a toda a sociedade o que consideramos crendice. Também não podemos esquecer o incalculável valor da arte medieval expressa nas grandes catedrais, nem a genialidade do pensamento teológico demonstrada por um autor como São Tomás de Aquino. Não são produtos das trevas. A expressão Idade das Trevas apareceu primeiro no Renascimento, quando a cultura europeia redescobriu a estética greco-romana e, depois, no século XVIII, quando os intelectuais franceses atribuíram à filosofia iluminista o papel de fonte de toda a política civilizada. O pressuposto depreciativo da expressão só revela a ignorância de quem a usa.»

A mim próprio faço a pergunta: «A Idade dos Dias de Hoje é a Idade das Trevas?», e não me sinto nada bem com a resposta que me vem à cabeça.

domingo, janeiro 10, 2021

Qual é coisa, qual é ela, que nasce com a Pessoa, a Educação consolida, a Escola abala, a Economia esquece e a Política esmaga?

 POLÍTICA E EDUCAÇÃO, 2/52

Qual é coisa, qual é ela, que nasce com a Pessoa, a Educação consolida, a Escola abala, a Economia esquece e a Política esmaga?
1) E a resposta é… a Tolerância.
2) Como sempre, um título não diz tudo; e quanto maior, pior. Por isso, há que esclarecê-lo, há que, neste caso, modulá-lo, matizá-lo.

3) Para começar esse cuidado de matização, a definição, circunstancial, de Tolerância: numa conversa com o filósofo Paul Ricoeur, Jean-Pierre Changeux, biólogo e professor de Neurobiologia, enumera-a ao lado da Boa Vontade e da Paciência, depois de a referir a propósito de tentar Compreender — no caso concreto da sua fala, a propósito das religiões.
4) Não vamos complicar a definição de Tolerância, apenas proporei considerar que a Tolerância tem a ver com identificar diferenças, aceitar as diferenças, agir respeitando as diferenças e não tentar, mesmo que cordialmente, convencer os outros que as nossas crenças, as nossas perspectivas, os nossos valores, são melhores, mais justos e mais correctos.
5) No mesmo diálogo, Paul Ricoeur diz assim a propósito do uso da palavra Tolerância: “A tolerância passa, de facto, por diversos limiares: no primeiro limiar, consiste em suportar o que não é possível evitar. Mas, é preciso passar desta tolerância forçada a uma tolerância aceite e escolhida. É do interior da relação com o fundamental que há convicções diferentes da minha. A partir daí, a tolerância já não é imposta por terceiros que me dizem: guarde os seus limites, não vá mais longe; terceiros que, de fora, me impõem um constrangimento. É de dentro que reconheço que há outros diferentes de mim, pensando de maneira diferente da minha. Se assim é, o problema da tolerância ultrapassa a relação da ciência e da religião, abrange todas as convicções. Não é só a ciência que detém a chave do problema da violência entre os homens.”
6) A Tolerância nasce com cada ser humano. Sim, cada vez mais as espantosas experiências “ovo-de-colombo”, que os incríveis estudiosos do comportamento humano conseguem conceber, mostram que é assim; e mostram também outros afectos, outras necessidades e motivações — e confirmam que cada criança que nasce não é um anjo celestial que se junta a outros.
7) A Educação não terá o radical poder que António Aleixo sintetiza dos versos que dizem «Sou apenas o produto / Do meio onde fui criado»; mas tem mesmo muito poder! Tem o poder de consolidar o que de melhor o ser humano traz consigo à nascença, e o poder de amaciar, dominar, o que traz de pior. E Educação é, antes de mais, influência parental e familiar — naturalmente aceite pela criança.
8) A Escola abala. Sim, a Escola passou a aparecer na vida da criança como a primeira — e muito valorizada! — instituição social que influencia o desenvolvimento da criança, sendo até a Família a primeira instituição social a reconhecer, aos olhos da criança, a importância da Escola e do que nela fazem com as crianças e os jovens seus filhos (seus, da Família). Acontece que a Escola actual é marcada, cada vez mais, por objectivos de capacitação livresca, conhecimento fragmentado e competição entre alunos — nunca houve tantos ‘rankings’ como agora, nem prémios de excelência por se ser melhor que os outros; e a Escola põe os alunos a disputarem entre si décimas e centésimas nas suas avaliações escolares finais. A Escola, nos dias de hoje, não é socialmente agregadora, é selectiva e desadequadamente competitiva.
9) A Economia esquece. Para a Economia actual, dominada pela expansão ilimitada, sustentada no crescimento constante e no consumismo permanente, de usa-e-deita-fora, a Tolerância é uma perda de tempo — e Tempo é Dinheiro! Há muito que é assim, e não se vê maneira de deixar de ser.
10) A Política esmaga. Depois da invasão do coração da instituição parlamentar dos Estados Unidos da América do Norte, o Capitólio, é preciso dizer mais alguma coisa? Na Europa, o radical movimento a favor da Tolerância aconteceu no início da década de 50 do século XX, quando os pais fundadores da actual União Europeia ousaram quebrar a lógica tradicional dos vencedores e dos vencidos e inventaram o projecto da Europa Unida — que é feito, nos dias de hoje, desse ideal de Paz, Tolerância e União?
11) Num artigo de opinião, na edição do Público de ontem, o sociólogo António Barreto escreve assim, a propósito da invasão do Capitólio: “Como foi possível? E como se pode evitar que seja novamente possível? Esse é o verdadeiro problema. Gente como esta, programas como este e políticas como esta só são possíveis, em democracia, porque os democratas deixam, porque a democracia tem tantos ou mais defeitos, porque os democratas e as esquerdas se transformam em figuras detestáveis de arrogância e suficiência. Porque os democratas decretam e protegem os seus privilégios e nunca se esquecem de defender os seus.”
12) As interrogações postas por António Barreto obrigam-nos a trazer à reflexão o célebre Paradoxo da Tolerância de Karl Popper; e obrigam-nos a pensar a sério que queremos fazer com a Educação e a regulação da Justiça Social e Política.
13) Por cá, no jardim à beira mar plantado, que tema central tem sido debatido até à exaustão, mas que sem que ninguém consiga dar a volta convincentemente? Precisamente a tolerância com André Ventura e o o partido que lidera, o Chega: aceita-se ou não um dirigente político, ou um partido político assim, num ministério governamental, ou mesmo com primeiro-ministro? É isso mesmo: não se chega a conclusão nenhuma; e porquê? Porque não há uma cultura social e político-social da Tolerância e dos valores afins: a Paciência e a Boa Vontade de que fala Paul Ricoeur; e também a Verdade, a Honestidade, a Coerência e o Respeito Humano.
14) Sim, no meu entender, temos vindo a acentuar nas sociedades — até nas que são geralmente apontadas como os grandes bastiões da Democracia — as reacções e os comportamentos de intolerância, numa triste regressão civilizacional que, na esfera da Religião, podemos equipara ao regresso ao olho-por-olho-dente-por-dente do Velho Testamento bíblico, que, precisamente, o Novo Testamento procurou amaciar e eliminar, substituindo-o pelo Perdão e pela Tolerância.
15) Não termos nós acabado de assistir a uma vitória da Tolerância? Estou a falar dos debates televisivos das eleições presidenciais portuguesas. Quais fora os debates em que se tiveram, como o próprio disse, conversas «porreiras», até com o intolerante/“intolerante” André Ventura? Foram todos os debates com o candidato Tino de Rans. Por todos os outros — e pela Comunicação Social, em geral — considerado uma carta fora do baralho, foi o único que que conseguiu expor, sem interrupções, e sem contraditórios deliberadamente a serem ouvidos por eleitores a arregimentar, as suas ideias, os seus pensamentos, as suas parábolas, a sua cultura simples. Será que a Simplicidade é um valor irmão da Tolerância? Acho que o Tino de Rans mostrou-nos que sim, que é.
16) Tino de Rans teve o condão de pôr todos os outros candidatos a ouvi-lo, todos eles sem duas pedras na mão. Ele é que os motivou com as suas 4 pedras, a fazer lembrar a pedra do viajante que inventou a Sopa de Pedra. E como conseguiu ele isso? Os outros, como sempre o consideraram como não sendo perigoso, dispuseram-se a ouvi-lo — e seguramente todos eles aprenderam com ele! Além disso, mesmo quando contraditou os seus oponentes — e poucas vezes o fez — fê lo sempre com Simplicidade e Tolerância.
17) Ao não o considerarem, com genuína boa-fé, adversário perigoso, os outros candidatos presidenciais, curiosamente, chegaram-se ao sentimento natural, genuíno que nos bebés alimenta os comportamentos de tolerância; e esta, hein?
18) A Política Intolerante é a negação da própria Política. Será possível conceber a Política, em sentido estrito, sem Tolerância? Se não pensarmos assim, que temos nós, afinal, aprendido com a Grécia Antiga que tanto louvamos nas suas realizações e nos seus escritos?

domingo, maio 31, 2020

PARTILHAR É CONDIÇÃO NATURAL DO SER HUMANO

1) No âmbito da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, explorei com uma turma do 8.º ano de escolaridade, um inquérito de David Sloan Wilson, professor de Biologia e Antropologia, inquérito esse que acabou por se tornar um clássico no trabalho de alunos de Psicologia e de Biologia, a propósito do tema da Evolução do Ser humano.

2) No inquérito, muito simples, é pedido aos estudantes que indiquem as características que associam ao bem, e as características que associam ao mal.

3) Acabei por também fazer o inquérito a alunos do ensino secundário, recolhendo 30 respostas válidas do básico e 32 do secundário.

4) No geral, as respostas dos meus alunos alinham genericamente com as respostas que conheço do inquérito original, com ligeiríssimas variações. A primeira característica má é mesmo completamente sobreponível nos 3 casos: egoísmo.

5) No meu inquérito, acrescentei duas perguntas: que os alunos indicassem exemplos de pessoas boas e más que encontrassem na comunicação social. Só uma escolha passou os 50% dos 62 alunos; e foi nas pessoas más: foi Donald Trump.

6) Coerente, na prática, com a sua bem explicitada concepção de governação de um dos países mais poderosos do Mundo, Donald Trump tem retirado os E.U.A. de todos os acordos de cooperação ou regulação internacional que pode, o Presidente norte-americano não pára. Precisamente nesta altura, chega-me a casa este 'cartoon' tão elucidativo.

7) As circunstâncias em que o Mundo vive no tempo presente, amplificadas pelo massivo, acelerado  e muito agressivo comportamento da Comunicação Social, em geral, com fluxos e refluxos de informação e desinformação, são de molde a alimentar a dúvida, a insegurança e a incerteza dos cidadãos: vamos continuar com a nossa casa (leia-se: o nosso país) de portas abertas, deixando entrar e podendo sair; ou vamos, ao invés, fechar-nos em casa e aconselhar a que os outros façam o mesmo?

8) Penso que a questão não deve ser colocada na dicotomia "pessoas boas 'versus' pessoas más"; mas antes entre as características boas e as características más das pessoas. Um exemplo actual, flagrante, é a trágica e brutal morte da Beatriz às mãos do Rúben. Até à tremendamente infeliz situação, o rapaz era praticamente um modelo de jovem cidadão, ele encaixava perfeitamente na lista das características das pessoas boas, os seus comportamentos pessoais e sociais testemunhavam-nas todas. Até que...

9) Sou muito céptico na filosófica questão da luta entre o bem e mal. Veja-se o caso de Hitler, como ele dá testemunho da tão intrínseca fragilidade do seu humano: super-simplificando as coisas, podemos dizer que ele "tentou" ser bom, quando se candidatou à Escola de Belas-Artes de Viena. Não o tendo conseguido, o mal escancarou-se dentro dele, e toda a sua ascensão social e política mostra como um simples vírus, de uma única pessoa, pode disseminar-se, acordar parceiros adormecidos ou em estado latente noutras pessoas e dominar completamente um poderoso país, e quase o Mundo todo.

10) Estarão os grupos humanos condenados à vitória do mal sobre o bem? Não, creio convictamente que não estão. Com a mesma convicção, afirmo que resignarmo-nos a essa sorte, deitar a toalha ao chão, é negarmos a nossa própria natureza. E é essa consciência e essa pedagogia junto, não apenas dos mais novos, mas de todos os cidadãos do Mundo, que é a razão de ser deste apontamento.

11) Não vou invocar Konrad Lorenz, já o fiz bastas vezes. Vou onvocar António Damásio e David Sloam Wilson. Damásio leu Wilson, não sei de Wilson leu Damásio. No que aqui trago, Damásio fala de altruísmo e Wilson fala de partilha.

12) Diz António Damásio:
«A cooperação desenvolveu-se como irmã gémea da competição, o que ajudou a seleccionar os organismos que exibam as estratégias mais produtivas. Consequentemente, quando hoje nos comportamos de forma cooperativa, com uma certa dose de sacrifício pessoal, e quando designamos de altruísta esse comportamento, isso não quer dizer que os seres humanos tenham usado o seu bom coração para inventar a estratégia cooperativa. [...] A questão do altruísmo é um excelente ponto de partida para a distinção entre as primeiras "culturas" e a sua variedade madura. O altruísmo tem a sua origem na cooperação cega, mas pode ser analisado e ensinado no sei das famílias e nas escolas como estratégia humana deliberada. [...] Nada garante que resulte sempre, mas existe como recurso humano consciente, presente através da educação.» (1)
13) E diz ainda o seguinte:
«A homeostasia básica tende a cumprir o seu dever relativamente a cada organismo cultural separável e nada mais. Deixados por sua conta, sem o efeito equilibrante de esforços civilizacionais determinados, visando algum grua de integração, e sem o benefício de circunstâncias favoráveis, os organismos culturais não tendem a coalescer.» [aglutinar, ligar, unir] (2)  

13) Por seu lado, David Sloam Wilson afirma:
«Esta e outras experiências revelam que a mentalidade humana se baseia fundamentalmente na partilha. [Não serão o altruísmo e a partilha o oposto do egoísmo?] Se não partilhámos intenção e atenção, nem sequer podemos fazer uma coisa tão simples como apontar para um objecto de interesse mútuo e muito menos partilhar os nossos comportamentos e representações simbólicas. Felizmente, a partilha faz parte do nosso meio social externo há tempo suficiente para se ter incorporado geneticamente nas nossas mentes, tão profunda e subconscientemente que não a reconhecemos como partilha até a estudarmos por métodos científicos.» (3)
14) As constatações científicas  de Wilson devem ser muito do agrado dos defensores da completa separação ente o Homem e os outros animais: é que os nossos parentes evolutivos mais próximos não apresentam esta capacidade de partilhar; mas o bebé humano, espontaneamente, apresenta!

15) O que será uma contrariedade para os criacionistas é terem de admitir, simultaneamente, que a competição, essa sim, é parte intrínseca do património comportamental tanto de símios como do Homem. Em conclusão, o que nos eleva é o altruísmo, é a partilha.

16) Penso que acabamos por nos confrontar com as duas grandes tarefas dos grupos humanos: a transmissão cultural (a Educação), e a regulação da vida cívica (a Política).

17) E voltamos à ideia dos jovens sobre as pessoas más, voltamos a Donald Trump. O que tenho achado especialmente interessante e promissor é ver que, apesar da quase violenta assertividade dos presidentes Trump e Bolsonaro (a 2.ª escolha, também destacada dos meus alunos), os sistemas de distribuição democrática de poder, regulando, aplacando a intensidade do egoísmo, e do despotismo, funcionam: ao nível dos governos regionais, de estados, ou distritos, os todo-poderosos presidentes têm de aceitar e resignar-se ao limite do seu próprio poder presidencial.  Logo, a Política é mesmo importante! A regulação formal da vida cívica, não pondo, como simbolicamente se diz, todos os ovos no mesmo cesto, é amiga da, está em sintonia com ela, condição básica, genética, do ser humano: a partilha, o altruísmo.
____________________________________
(1) António Damásio, "A Estranha Ordem das Coisas", 2017, Lisboa, Círculo de Leitores - Temas e Debates, p. 322.
(2) António Damásio, "A Estranha Ordem das Coisas", 2017, Lisboa, Círculo de Leitores - Temas e Debates, p. 299
(3) David Sloan Wilson, "A Evolução para Todos", Lisboa, Gradiva, 2007, p. 244.