Hoje de manhã, no breve momento de leitura matinal, ao virar da página 101 para a 102, da colecção Mundo de Letras, da Porto Editora, pude ler a seguinte passagem, feliz e oportuna coincidência com o apontamento de ontem:
Depois do banho e do chocolate, às dez horas, consolado e quentinho dentro do roupão de veludo, rompi pelo quarto do meu Príncipe, de braços abertos e sedentos:
- Oh Jacinto!
- Oh viajante!...
Quando nos estreitámos, fartamente, eu recuei para lhe contemplar a face - e nela a alma. Encolhido numa quinzena de pano cor de malva orlada de peles de marta, com os pêlos do bigode murchos [lá mais para trás no romance, o personagem Grilo, o "venerando preto" camareiro de Jacinto, dissera a Zé Fernandes: "- Sua Excelência sofre de fartura."], as suas duas rugas mais cavadas, uma moleza nos ombros largos, o meu amigo parecia já vergado sob o peso e a opressão e o terror do seu dia. Eu sorri, para que ele sorrisse:
- Valente Jacinto... Então como tens vivido?
Ele respondeu, muito serenamente:
- Como um morto.
Forcei uma gargalhada leve, como se o seu mal fosse leve:
- Aborrecidote, hem?
O meu Príncipe lançou, num gesto tão vencido, um "Oh" tão cansado - que eu compadecido de novo o abracei, o estreitei, como para lhe comunicar uma parte desta alegria sólida e pura que recebi do meu Deus!
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