#TOLERÂNCIA328 - O QUE O ZERO NOS ENSINA SOBRE A TOLERÂNCIA
Tive hoje acesso à revista Superinteressante (versão digital, edição Biblioteca) dedicada ao Zero: "História do Zero, origens e evolução da ideia mais revolucionária da Matemática".
Foi preciso uma longa aprendizagem até à aceitação da existência do Zero. Foi preciso vencer muita intolerância. O Zero desperta ideia de vazio, de ausência, de nada, de não existência. As culturas humanas, independentes entre si, andaram às voltas com o Zero, umas mais pacificamente, outras mais tumultuosamente.
Na cultura que é a principal matriz do pensamento europeu ocidental, o dossier da Superinteressante designa Aristóteles como o pecador original: «Os gregos antigos, cuja influência no pensamento ocidental tem sido imensa, confrontaram-se deliberadamente com a ideia de vazio, marcando um forte contraste com as culturas mesopotâmica e maia que, pelo menos tangencialmente, se aproximaram
da noção de zero. Esta resistência deve-se, em grande parte, às ideias filosóficas de Aristóteles, que defendia que a natureza abomina o vácuo ('horror vacui'). Segundo o filósofo de Stagira, o vazio não podia existir porque não tinha qualquer função no cosmos; para ele, todo o espaço tinha de ser preenchido com matéria ou substância.»
Mais à frente, o grande texto acrescenta: «A ideia do 'horror vacui' tornou-se assim um dogma no pensamento medieval.», e parece que Galileu teve dificuldade em lidar com essa ideia.
«Até meados do século XVII, os atlas europeus evitavam os espaços vazios, acrescentando ilustrações de animais marinhos, lacunas imaginárias e anotações pseudo-científicas. O vazio, tanto na ciência como na representação do mundo, era uma incógnita intolerável.»
«A incapacidade de aceitar o vazio tornou extremamente difícil a incorporação do zero na matemática ocidental. Não se tratava apenas de uma questão técnica ou numérica, mas de um choque cultural e filosófico. Nesse sentido, aceitar o zero implicava aceitar que poderia existir um espaço sem conteúdo, uma quantidade sem valor, uma ausência que tivesse um significado próprio. E isso, na Europa medieval, era uma ideia que poucos estavam dispostos a tolerar.»
A Física moderna aceita pacificamente a existência do vácuo, fala em "partículas virtuais": «Estas partículas não são uma fantasia matemática. Surgem diretamente do princípio da incerteza, que permite — durante um período de tempo muito curto e em escalas microscópicas — tolerar violações da conservação da energia.»
A história do Zero mostra-nos — é uma muito importante aprendizagem cultural e civilizacional das actuais gerações — que na aquisição do conhecimento científico a intolerância não é boa conselheira: a intolerância a novas ideias, a novas hipóteses. Até na convicção pessoal, sentida com muito boa fé, pode haver uma atitude de intolerância.
Em “Uma Campanha Alegre” (que escreveu entre 1890-1891) Eça de Queiroz escreveu, a abrir o livro, uma “Advertência”, que começa assim: «A mocidade tem destas esplêndidas confianças; só por amar a Verdade imagina que a possui.» Talvez até os mais velhos nunca percam essas esplêndidas confianças da mocidade. São muito tentadoras, enchem-nos de sensações e sentimentos saborosos. Só que nós, agora, ao contrário de Galileu e, mais ainda, de Aristóteles, estamos bem avisados.
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