sábado, setembro 27, 2025

#TOLERÂNCIA272 - DE ONDE VEM O POPULISMO? DO POVO!

 

Vou reproduzir integralmente o texto de Henrique Monteiro, publicado na edição do Expresso, não porque o subscreva integralmente (penso que ele e eu somos de quadrantes ideológicos bem distintos), mas porque dá relevo à questão da tolerância na dinâmica entre as maiorias e as minorias, entre as democracias e as autocracias, entre o liberal e o iliberal. Sim, por mim, proponho a discussão do artigo.

«Todos conhecem a frase “a democracia é o pior dos regimes, excetuando todos os outros”. Um regime
político decente tem de assegurar liberdade, mas também leis gerais e abstractas, igualdade de oportunidades e justiça nas decisões. Por isso, uma democracia séria e robusta tem, obrigatoriamente,
de restringir a liberdade de cada indivíduo, de forma a que não coloque em causa a liberdade de outros. Isto é, tem de ter regras claras, ou ‘linhas vermelhas’.

»Entramos, assim, na questão de saber quem define essas regras. A maioria, como é óbvio, dirão alguns. De facto, parece evidente, porém esbarra com a diferença entre maioria e razão, ou ser razoável. Nem sempre ter a maioria equivale a ser justo, decente ou assegurar a liberdade. Pelo contrário, a organização da liberdade impõe restrições, o que implica a inteira tolerância para com as minorias e a compreensão das suas legitimidades, desde que não queiram impor os seus pontos de vista. Como perceberão, isto aproxima-se muito do conceito de imperativo categórico do filósofo Immanuel Kant — “age como se a tua acção pudesse ser erigida em lei universal da natureza”.

»E aceitamos que há leis universais da natureza, que nada nem ninguém pode pôr em causa? Ou
achamos que elas dependem de idiossincrasias, latitudes e crenças? Se há valores universais (creio que sim) temos de considerar um ‘chão comum’ desses valores ou dessa lei universal, para todos poderem conviver e dialogar, mesmo que com ideias opostas entre si, religiões diferentes, hábitos diversos, Mas qual lei? Quem a dita — e voltamos ao início.

»Para um crente é Deus ou o Ser (ou pensamento, 'corpus' moral ou filosófico) em que acredita. Não por acaso, no essencial, eles são todos semelhantes — salvo alguns casos de extremismo que existem em todas as variantes, dos judeus ultraortodoxos aos jiadistas, dos budistas aos hindus e cristãos radicais. Para quem em nada acredita, é-me mais difícil ensaiar uma explicação, embora, naturalmente, a maioria dos ateus e dos niilistas respeitem essa lei não escrita, a que Kant chamou lei universal da natureza. Se seguirmos o raciocínio, a liberdade e a democracia colhem-se neste campo, e não na fria lei dos números de maiorias ou minorias. Há países com uma maioria de votos expressiva em programas, pessoas ou partidos que não honram nem uma nem outra. Não são democracias, ou são, como agora se diz, ‘democracias iliberais’. E, de facto, são cada vez mais, o que prova que a democracia, em si mesmo, não assegura a existência de liberdade. A democracia, sem liberdade, pode não passar de um sistema da lei do mais forte, traduzido em votos. Mas qual a legitimidade de uma maioria condenar ao ostracismo a minoria? Que direito tem de a calar? Que direito tem de proibir movimentos antidemocráticos? Por que se proíbe o nazismo e o fascismo ou, noutros casos, o comunismo? Mais ainda: o racismo, o discurso de ódio e outras excrescências democráticas? Será possível a uma maioria proibir tudo o que não gosta? E será, ainda assim, uma democracia?

»Voltemos atrás. Não necessita a democracia de um absoluto e indispensável comprometimento com a liberdade individual, desde que esta não coloque em causa ou prejudique a liberdade dos outros? Ou seja, não necessita de restringir a vontade da maioria, quando esta se torna intolerante? Ter ‘linhas vermelhas’ não é uma mera questão política, mas de civilização. Sem compreender que há quem não jogue o nosso jogo, perdemo-nos.

»O populismo diz agir em nome do que o povo quer. Os democratas têm de conjugar a vontade do povo com o dever que, como seres humanos, têm uns para com os outros. Com respeito, tolerância e fraternidade, como aliás postulam Kant e a Declaração universal dos Direitos Humanos, da ONU.»

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sexta-feira, setembro 26, 2025

#TOLERÂNCIA271 - TOLERÂNCIA E LAICIDADE

 #TOLERÂNCIA271 - TOLERÂNCIA E LAICIDADE

Acaba de sair em França um livro que fico curioso de ler: "1882‑1905, ou la Laïcité Victorieuse", de Jean Baubérot-Vincent. A edição do "Le Monde" de hoje apresenta-o assim:

«Invocada a torto e a direito no debate público, a palavra 'laicidade' é ao mesmo tempo familiar e misteriosa. Alguns brandem-na para excluir, outros invocam-na em nome da tolerância – mas a maioria ignora o que contêm verdadeiramente os textos fundadores da laicidade «à francesa». Porque a missão do historiador é «dar a cada acontecimento o seu verdadeiro rosto», segundo Walter Benjamin (1892-1940), Jean Baubérot-Vincent empreende, em "1882-1905 ou a Laicidade Vitoriosa" (PUF, 360 páginas, 23 euros), refazer a história das leis que laicizaram a escola pública (1882) e separaram as Igrejas do Estado (1905).

»Jean Baubérot-Vincent, que acaba de concluir quatro décadas de investigação sobre a laicidade, é sem dúvida o historiador mais bem colocado para realizar este trabalho. Presidente honorário da École Pratique des Hautes Études (EPHE), antigo titular da cátedra 'História e Sociologia da Laicidade' (1991-2007), fundador, em 1995, do Grupo 'Sociedades, Religiões, Laicidades' (CNRS-

EPHE), escreveu numerosas obras sobre a laicidade, entre as quais uma trilogia monumental que constitui, até hoje, o estudo mais aprofundado sobre a lei «liberal, justa e sábia» de 1905, nas palavras de Jean Jaurès (1859-1914).

A IIIª República, uma nova era

»Nesta obra esclarecedora, Jean Baubérot-Vincent procura, como escreve, combater o «pronto-a-pensar» de uma época em que, por vezes, todas as afirmações se equivalem. Aí resume as 2500 páginas que dedicou ao longo da vida à laicidade, mas consegue, apesar deste esforço de síntese, conservar as 'nuances' das suas análises passadas. A sua narrativa demonstra assim com grande clareza que a lei de 1882 coroou um trabalho de ourives baseado no «apaziguamento e pragmatismo» e que a de 1905 é o fruto de uma hábil estratégia «do junco», que consistiu em curvar sem nunca quebrar.

»Estes textos de «conciliação» assinalam, segundo o historiador, a viragem de França para o segundo «limiar de laicização». O primeiro tinha surgido com a «meia-laicidade» da Revolução – a lei era civil, mas a moral pública enraizava-se na religião. As leis de 1882 e de 1905 abrem, pelo contrário, uma era de «laicidade completa», nas palavras de Aristide Briand (1862-1932): com a escola laica e a separação das Igrejas e do Estado, a IIIª República «distingue, separa e liberta da tutela estreita da Igreja Católica» as funções da vida pública, resumia na época o republicano Ferdinand Buisson.

»Com "1882-1905 ou a Laicidade Vitoriosa", Jean Baubérot-Vincent pretende fazer uma obra útil. Mostrando que a França hexágona chegou ao apaziguamento na viragem do século, apesar da intensidade da guerra das duas Franças – a filha primogénita da Igreja contra o país da Revolução –, espera afastar os seus contemporâneos dos becos sem saída do «presentismo». O passado nunca fornece «receitas para aplicar mecanicamente», reconhece, mas permite «enfrentar lucidamente» os desafios de hoje – e isso já é muito.»

Ainda tenho na cabeça a analogia que fiz com as aulas de Português de Sebastião da Gama: a Tolerância acontece. No entanto, de tempos a tempos, devemos olhar o dia-a-dia com algum distanciamento e ocuparmo-nos com as dimensões psicológicas, filosóficas, históricas, sociais, culturais, antropológicas da Tolerância, e também da intolerância. Daí a minha curiosidade perante este livro.

Se o conceito de Tolerância surgiu e se impôs a propósito da Religião, o autor vem agora ligá-la ao que costuma ser apresentado na Política como o contrário da religião: a laicidade. O primeiro capítulo do livro tem este título: "A escola, uma questão central da laicidade".

Sim, são as escolas que formam e deformas as mentes, as mentes de crianças e jovens que, de boa fé, acreditam no saber, na ciência, na competência, na honestidade e na boa-fé dos professores. Pode tanto a escola!... Olhem se as escolas fossem mesmo aqueles lugares de vida e aprendizagem que os grandes pedagogos mundiais ciclicamente tentam que elas sejam!...

O beco sem saída do 'presentismo'... Deixem os professores libertar-se da pressão do presente, do imediato, deixem-nos seguir pelos caminhos que mais gostam e melhor conhecem, equipados com a bagagem que dominam com à-vontade... Deixem os professores assim que, com o tempo, verão como o bom conhecimento do Passado é duma imensa riqueza para se avançar no Futuro com confiança e entusiasmo.

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quinta-feira, setembro 25, 2025

#TOLERÂNCIA270 - HOJE VAMOS FAZER AS PALAVRAS CRUZADAS DO JORNAL

 #TOLERÂNCIA270 - HOJE VAMOS FAZER AS PALAVRAS CRUZADAS DO JORNAL

Apetece-me dizer, rindo-me do que digo, que não há jornal diário que se preze que não traga lá para as últimas páginas um jogo de palavras cruzadas. Fui ver... inclusivamente, fiz uma pequena busca em jornais de língua inglesa, língua francesa e língua espanhola: lá estão, em muitos deles, as palavras cruzadas.

Por que razão me lembrei eu hoje das palavras cruzadas? Por causa da última aula oficial que dei. Um pequeno grupo de alunos do 9.º ano, quase todos nos 14 anos, infantilmente irrequietos, muito focados na conversa e no entretenimento com o parceiro do lado, o da frente ou o detrás. A turbulência fisiológica, motora, quase se ouve a acontecer naqueles corpos em que o acne das faces é descarado. Boamente, falei-lhes de quando a amizade, o companheirismo, o envolvimento activo uns com os outros, são improdutivos; sobretudo em situação de sala de aula, em que se lhes pede foco atencional, sossego e escuta às lições dos professores.

Vim para casa a pensar como poderia "agarrá-los", como muitas vezes se diz nas conversas entre os professores duma turma.

A deliciosa ficção do "À Procura da Terra do Nunca", que tantas vezes passei nas minhas aulas, em que me imaginei com os alunos como tantas vezes vemos no filme o autor do Peter Pan fazer: olhando os irmãos envolvidos entre si, fantasia-os em aventuras mágicas que deliciam a motivação e a alma.

Imaginei os meus alunos com a mesma intensidade interactiva, a mesma turbulência desordenada, realizando uma tarefa... produtiva! Eles, ali na sala, 2 a 2, em ambiente ruidoso, com uma matriz de

palavras cruzadas a desafiá-los: cooperativamente, com o parceiro; competitivamente, com os outros pares. Pensando e atirando palavras pela boca fora e, sem que nisso pensassem, desenvolveriam vocabulário, apurariam as artes da conversação, aprenderiam conceitos e discriminariam os conceitos uns dos outros.

Cheguei-me aos dóceis e pacientes 'chatbots' e pedi-lhes que me construíssem um jogo de palavras cruzadas. Só mesmo numa primeira abordagem exploratória, dei-lhes esta instrução: «Faz um jogo de palavras cruzadas em que apareçam valores, sentimentos, atitudes pessoais, qualidades humanas, entre as quais a tolerância.» Um dos resultados foi este:

Horizontais

6. Qualidade de aceitar e respeitar a diversidade, o que é diferente. (10 letras) 8. Sentimento de segurança ou esperança em relação a uma pessoa ou algo. (9 letras) 10. Qualidade de se colocar no lugar do outro, sentir o que o outro sente. (7 letras) 13. Expressão de verdade, conformidade com os factos, honestidade. (11 letras)

Verticais

1. Ato ou efeito de ajudar, suporte moral ou material. (5 letras) 2. Qualidade de quem demonstra bondade, afeto e compreensão. (7 letras) 3. Característica de ser modesto, de reconhecer os próprios limites e não ser arrogante. (8 letras) 4. Sentimento intenso e positivo de afeto por alguém. (5 letras) 5. Valor que implica justiça, equidade e a correta atribuição de méritos e punições. (7 letras) 7. Sentimento profundo de afeto, atração ou dedicação. É o oposto de ódio. (4 letras) 9. Capacidade de esperar, de adiar a satisfação de um desejo. (7 letras) 11. Sentimento de felicidade e bem-estar. (7 letras) 12. Sentimento ou atitude de gratidão por algo bom recebido. (12 letras)

A seguir, ofereceu-se para fazer a quadrícula, quer aceitei imediatamente. Nada mau para começar!

Assim que possa, trago para aqui a grelha para que todos possam experimentar. Veja-se o potencial de aprendizagem dos afectos e da linguagem a eles associada neste jogo de muita interacção entre alunos.

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quarta-feira, setembro 24, 2025

#TOLERÂNCIA269 - A TOLERÂNCIA NO 1.º DIA DE ESCOLA, NA PONTA DUM LENCINHO

 #TOLERÂNCIA269 - A TOLERÂNCIA NO 1.º DIA DE ESCOLA, NA PONTA DUM LENCINHO

Por várias razões, estou a ter uma semana muito especial [duma das ocorrências dei conta no #TOLERÂNCIA267) — e ainda só vou na 4.ª-feira. Tal como na 2.ª-feira e ontem me despedi dos alunos do 7.º ano… ao segundo dia de aulas!, hoje despedi-me duma turma do 9.º ano; e amanhã vou despedir-me da outra, também ao segundo dia de aulas.

Com a turma de hoje, na aula da semana passada eu tinha-lhes mostrado, já não sei a propósito de quê, a fotografia do nascer-do-sol desse dia (Há mais de 5 anos que tiro, todos os dias, fotografias ao nascer-do-sol, esteja onde esteja). Ora, aconteceu que hoje, vários alunos trouxeram fotografias do nascer-do-sol e do pôr-do-sol (uma das alunas fez mesmo questão de tirar uma fotografia ao nascer-do-sol de hoje). Pedi-lhes que me mandassem as fotografias por email, e no início do 2.º tempo da aula eu projectei-as no quadro e estivemos a conversar a propósito delas. Há pouco, já em casa, verifico que mais um aluno tinha acabado de me mandar mais duas fotografias do pôr-do-sol, fotografias que ele tirou há pouco tempo. A este aluno, mas também aos outros que partilharam as suas fotografias nas aulas, eu respondo por email, agradecendo a iniciativa do contributo para a aula de Cidadania e Desenvolvimento, e remato com a afirmação de Konrad Lorenz (o fundador da Etologia e Prémio Nobel da Medicina e Fisiologia de 1973) que ao longo de 36 anos de magistério de professor transmiti aos meus alunos: «Tanto a beleza do mundo natural como a beleza do mundo cultural são essenciais para manter o Homem espiritualmente são.»

O que os alunos hoje fizeram, trazendo as fotografias para a aula, é um preciosíssimo testemunho de como não é difícil, pelo contrário, envolvê-los com entusiástica e inteligente motivação para as dinâmicas das salas de aula. Sebastião da Gama dizia que a aula acontece. Nem mais, isto hoje foi a aula a acontecer a partir da notável iniciativa pessoal dos alunos, livremente realizada e fazendo todo o sentido, em perfeita sintonia com a aula anterior e também em perfeita sintonia com o espírito da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.

Entretanto, a aula tinha começado com uma situação em que à volta do reconhecimento dum erro dum aluno (que vinha da aula da semana passada) e da reacção que alguns dos colegas hoje tiveram perante o reconhecimento por parte do colega do erro. Aproveitei para falar acerca da tolerância aos erros e enganos dos outros. Sei que fui feliz na abordagem da situação porque todos me escutaram com quase arrepiante atenção, sorrindo boamente à medida que eu avançava na minha explanação. Acabámos todos por agradecer ao aluno que se autocorrigiu e aos colegas que se tinham atirado logo a ele, como que reclamando vitória, por tão importante oportunidade de aprendizagem para todos: ficámos todos, de certeza, a partir daquele momento, um bocadinho mais tolerantes.

Depois desta ocorrência durante a manhã, repare-se na coincidência — maravilhosa! — do que eu recebi à tarde duma muito querida colega e amiga. É verdade, já lá vão quase 50 anos... A mensagem veio pelo WhatsApp. Repare-se como partilha muito a natureza e a essência do que acabo de relatar da aula de hoje da turma do 9.º ano. Fiz apenas uns pequeninos ajustamentos para passar o escrito duma mensagem pessoal a um texto público, a minha colega não lhe passava, de certeza, pela cabeça que eu quereria publicar o texto.

«História…….

»Por causa dos teus textos, sobre Tolerância, de repente, há uns dias relembrei o meu primeiro dia de Escola… tinha 6 anos. [Era um] Colégio de freiras franciscanas. Usava farda e um bibe cor de rosa.

»No primeiro dia de aulas a minha Mãe foi levar-me . No bolso do bibe colocou um lencinho branco, lindo, com uma rendinha. Não me recordo do meu estado emocional.

»Levaram-me para uma sala grande onde estavam outras meninas e uma pianista. Ela tocou, cantámos, rezámos e no fim, em fila, com música de marcha, fomos para a respectiva classe.

»Chegou a hora do recreio, fui para um pátio onde haviam baloiços. Aproximei-me à espera da minha vez. Estava por perto outra menina, um pouco mais velha, que se chegou ao pé de mim e bateu-me na cara. Fiquei espantada, tirei o lencinho do bolso e limpei alguma lágrima, mas a menina rapidamente tirou-me o lenço da mão, rasgou-o, fez uma bola e devolveu-mo. Ainda disse a uma freira "Aquela

menina"… e a resposta foi "Não quero queixinhas."

»Quando a minha Mãe me foi buscar [eu não disse nada] e só em casa contei o sucedido e mostrei o lencinho. Ela, com a sua calma, respondeu: "Filha, tens de ser tolerante com algumas colegas. A menina deve ser aluna interna e está triste. Fica sempre um pouco afastada dela e não lhe batas."

»O termo tolerante era muito usado na minha casa. Seria um termo habitual da época??? Nós éramos muitos em casa??? E de certeza a história terminou com a frase lapidar usada na minha Família: "Filha, há coisas piores na vida"… O que nos fica na cabeça… ou na alma???? E de repente aparece…»

Estamos perante dois preciosos testemunhos de que a Tolerância se cultiva em casa e se cultiva na escola. Voltando a Sebastião da Gama, se ele diz na entrada do dia 24 de Janeiro (de 1949), a rematar o texto, com letras maiúsculas "A AULA DE PORTUGUÊS ACONTECE.", eu digo, por analogia, "A TOLERÂNCIA ACONTECE", vem pela relação face a face, pelo contacto pessoal, pela comunicação, pelo diálogo. Vai-se vivendo, e à medida que se vai vivendo, vai-se construindo a Tolerância.

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terça-feira, setembro 23, 2025

#TOLERÂNCIA268 - AI, QUEM ME DERA O FIO DE ARIADNE!

 #TOLERÂNCIA268 - AI, QUEM ME DERA O FIO DE ARIADNE!

A partir de hoje, bastam-me números de dois dígitos para falar das etapas que me faltam até ao lugar de chegada da viagem.

Não preciso dum fio de Ariadne para os passos que faltam, já que não vou voltar para trás, mas às vezes sinto-me na iminência de perder o norte das ideias e nessas alturas tenho vontade de ter o fio comigo e ir desenrolando-o. Hoje é um desses dias: o Minotauro é a cada vez mais agressiva e, a um tempo, descarada e sofisticada guerra de informação dos poderosos da Política, do Dinheiro e da Guerra; os 7 rapazes e 7 raparigas dos sacrifícios são todos os jovens estudantes das escolas; o Teseu são os professores — portanto, eu também —; a Ariadne é a lucidez do Pensamento Crítico que por vezes me sinto prestes a perder de vista.

O Fio de Ariadne de que eu aqui falo é, no fundo, o simbólico fio condutor da liberdade, da iniciativa e da acção, aquele ponto que é lugar, que é momento e que é decisão de tolerar ou não tolerar — sem perder o norte, sem perder a orientação do caminho.

Na série documental que conta o salvamento dos rapazes e do seu treinador na gruta tailandesa, foi tecido um fio de Ariadne para orientar o salvamento de todo o grupo, um a um. No último salvamento, o da criança mais pequena, a trama atinge o paroxismo num momento em que o médico-nadador larga o fio e durante alguns segundos nós, os espectadores, observamos com angústia os gestos em que ele desesperadamente procura agarrá-lo outra vez. (Bem, será mais razoável pensar que ele não terá procurado recuperar o fio com desespero, mas com um autocontrolo bem dominado. O desespero está certamente bem mais no sentir do espectador, que se sente bastante desamparado) O momento era absolutamente crítico, tudo se alinhava cada mais contra o objectivo de salvar também aquela criança. Finalmente o dr. Richard Harris consegue recuperar o fio. Que alívio para todos!

Que tarefa hercúlea as guerras de informação, a contra-informação e a desinformação hoje em dia

exigem aos professores! O que podem os professores fazer? Na minha opinião, têm de se multiplicar nas escolas os grupos de discussão nas escolas: discutir conteúdos de aprendizagem, discutir estratégias pedagógicas, discutir consistência da informação científica, discutir ideologias. Tudo com muita tolerância, ouvindo mais do que falando; e sem exigir a necessidade de consensos.

Não, na Educação ninguém vai lá sozinho, e quem decide acerca do trabalho dos professores e acerca da cultura e dos ambientes de aprendizagem nas escolas tem de ter a coragem e a determinação governativa para fazer empenhar as equipas de professores neste importantíssimo trabalho de reflexão crítica acerca da informação e dos conteúdos de aprendizagem.

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segunda-feira, setembro 22, 2025

#TOLERÂNCIA267 - O GOSTOSO SABOR DA BONDADE DA TOLERÂNCIA

 #TOLERÂNCIA267 - O GOSTOSO SABOR DA BONDADE DA TOLERÂNCIA

Nunca imaginei esta experiência pessoal, mas fiquei muito contente por me ter acontecido.

Para se perceber bem o contexto: a) avisada há muito da minha intenção de me reformar até ao final deste mês, a Direcção da escola, obrigada a atribuir-me um horário (e só depois da minha saída pode pedir a minha substituição), muito correctamente, deu-me turmas em que a eventualidade de os alunos não terem imediatamente um outro professor não lhes trouxesse grandes danos (sim, grandes danos, já que há sempre danos quando alunos ficam privados de aulas, mesmo que durante pouco tempo). Calharam-me, então, duas turmas do 7.º ano e outras duas do 9.º ano na disciplina de Cidadania e Desenvolvimento.

A disciplina de Cidadania e Desenvolvimento, na Eça, reparte com a disciplina de TIC as turmas em 2 turnos, e decorre no regime de semestres: durante o 1.º semestre Cidadania e Desenvolvimento tem um dos turnos e a de TIC tem outro; no segundo semestre, trocam.

Às 4 turmas que me foram atribuídas, dei na semana passada duas aulas, a abrir o semestre; e nesta semana dei (e darei) as duas aulas a "fechar" o semestre. Quer dizer, a fecharem as aulas comigo, já que estarei reformado a partir do dia 1 de Outubro. Portanto, na semana passada dei as boas-vindas aos alunos, e nesta semana despedi-me deles.

Na primeira aula da semana passada (que foi também a primeira aula do ano lectivo tanto para os alunos

do 7.º A como para mim), 3 alunos (um rapaz e duas raparigas) interpretaram erradamente o horário (pensaram que teriam uma hora de Cidadania e Desenvolvimento e outra de TIC, uma a seguir à outra, quando, na verdade, têm duas de CD ou duas de TIC, trocando os turnos entre si lá para o mês de Fevereiro).

No final da primeira aula acompanhei os 3 alunos à aula de TIC, não sem dizer à minha colega que, se eles quisessem e ela também o quisesse, eu não me importava que eles continuassem comigo, até teria gosto nisso. Os 3 alunos ficaram na aula de TIC por opção da minha colega — correcta opção.

Hoje, precisamente uma semana depois, o aluno que se enganou na aula da semana passada, logo ao toque de entrada (eu já estava na sala de aula) assomou à porta e perguntou-me se podia ficar na aula, que iria na hora a seguir à aula de TIC. Boamente eu agradeci-lhe o interesse em estar na minha aula, mas ele não podia ficar, tinha mesmo de ir para a aula de TIC. O rapaz aceitou prontamente, sem qualquer insistência ou sinal de desalento.

Durante a aula, eu disse aos alunos que estávamos numa situação muito pouco vulgar: na aula anterior eu tinha dado as boas-vindas, e agora estava a fazer as despedidas.

No início do segundo tempo, o jovem aluno apareceu outra vez à porta e disparou a pergunta: «'Stôr, nós podemos vir todos para aqui quando faltarem 15 minutos para a aula acabar?... É que gostamos todos muito de si e queremos estar todos aqui.»

Percebi que os colegas do turno que tinha tido aulas comigo "tinham dado com a língua nos dentes" e disseram aos colegas do turno de TIC que seria a minha última aula. «Por mim, tudo bem, mas têm de falar com a minha colega e ela tem de autorizar.» «Já falámos, a 'stôra' disse que vem connosco.» «OK, então, apareçam.» O rapaz lá foi para a aula em bom correr.

Impreterivelmente, aos 15 minutos para acabar aquele tempo de aulas, oiço baterem à porta. Entraram todos, a minha colega de TIC por último. Sentaram-se e mantivemos uma conversa animada. A certa altura, eu disse-lhes: «Vocês não têm ideia da coisa extraordinária que me proporcionaram, nunca mais me vou esquecer de vocês!» É claro, sem perceberem onde eu queria chegar, pediram-me que lhes explicasse. «É que, mesmo a acabar o meu tempo de professor, consegui ter uma coisa que nunca pensei ser possível, e vocês deram-me essa experiência incrível!...» A atenção deles redobrava. «É que, com a presença de todos aqui, especialmente do turno 1, eu consegui dar uma aula de despedida sem ter dado a aula de boas-vindas, e a última aula foi mesmo a primeira! A primeira e única! Estou mesmo contente com este presente de despedida que vocês me deram!» Os alunos perceberam, riram-e e todos aplaudimos.

Um aluno do turno de Cidadania e Desenvolvimento disse então: «'Stôr', logo, quando eu chegar a casa, eu vou chorar, aqui não, não consigo.» Os colegas riram-se e eu, deliciado com a provocação que lhes ia fazer, perguntei se havia alguma carpideira entre eles, daria muito jeito. Pois claro, ninguém sabia o que era uma carpideira. Dei-lhes uma primeira pista, bem pequena pista, eles lançaram coisas para o ar, e uma muito arguta aluna concluiu tratar-se de uma pessoa que é paga para chorar. Acrescentámos depois alguns pormenores, sempre aproveitando o que eles livremente diziam. É claro, falámos dos funerais e das pessoas que querem chorar mas não conseguem. Que belo momento de aprendizagem cultural aconteceu! Aconteceu antes, aconteceu naquele instante e aconteceu nos momentos que se seguiram, até a aula acabar. É verdade, 10-12 minutos de aula podem ser realmente muito ricos!...

À saída, houve beijinhos e abraços. Depois de tão pouquinhas aulas!...

O segredo deste tão precioso momento de relação pedagógica: a bondade tolerante da minha colega de TIC, que teve a sensibilidade sábia de perceber o que estava a acontecer naquela dinâmica escolar tão precoce. Deliberadamente, conscientemente, assumiu a humilde discrição pessoal e profissional que a dinâmica solicitava. Como lhe estou grato!

A determinação daquele rapazinho, que mal teve tempo de me conhecer... Moveu uma montanha, envolveu toda a turma, ganhou para si os professores. Que alma grande ali está!

Vieram-me à consciência as tão preciosas e muito amorosas palavras de Sebastião da Gama no seu Diário... Que todos os professores as leiam e releiam. Que todos os deputados, governantes e decisores da Educação as leiam e releiam. Todos os anos, à entrada do novo ano escolar.

Quando fiquei sozinho, senti-me grato, recompensado, feliz. Emergiu depois o lado divertido: «Bem, nunca pensei que isso me acontecesse, mas hoje consegui fazer a quadratura do círculo!...»

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domingo, setembro 21, 2025

#TOLERÂNCIA266 - TOLERÂNCIA E INCERTEZA, OUTRA VEZ

 #TOLERÂNCIA266 - TOLERÂNCIA E INCERTEZA, OUTRA VEZ

É a terceira ou quarta vez que chego, nesta viagem, ao lugar da incerteza. Hoje volto também a uma autora de que já falei aqui. Trata-se de Leor Zmigrod.

A edição desta semana do semanário Expresso apresenta a investigadora assim: "Nascida nos Estados Unidos em 1995, a neurocientista e psicóloga política combina estas áreas com a genética para compreender o que conduz à radicalização. O ‘segredo’ pode estar no cérebro, explica Leor Zmigrod, que em 2020 a revista “Forbes” incluiu na sua lista de pessoas mais importantes com menos de 30 anos." A entrevista é conduzida pelo jornalista Luís M. Faria, o qual, na minha opinião, vai muito bem ao longo da conversa, fazendo perguntas muito pertinentes à jovem cientista, não deixando de a confrontar com a necessidade de clarificar o que é hipótese científica, especulação filosófica e conhecimento objectivo adquirido.

Pergunta: As redes sociais, como o TikTok, que parecem ter grande impacto na radicalização política, o que fazem ao cérebro?

Resposta: O que vemos é que, do ponto de vista tecnológico e económico, é muito lucrativo produzir conteúdos extremos que se tornam virais. E os algoritmos estão desenhados de forma quase cirúrgica

para explorar os factores que tornam as pessoas vulneráveis: mentes mais rígidas, mais impulsivas emocionalmente. Porque são esses que geram mais interacções e, consequentemente, mais lucro. Exploram as fragilidades do cérebro humano: a rigidez cognitiva, a impulsividade emocional. Por exemplo, quando alguém já tem tendência para ser cognitivamente mais rígido, as redes sociais vão apresentar-lhe cada vez mais conteúdos que confirmam essa visão do mundo, fechando-o numa bolha. A pessoa sente-se recompensada a curto prazo — através de 'likes', partilhas, dopamina —, mas, a longo prazo, fica mais vulnerável à radicalização.

Pergunta: Podemos dizer que as redes sociais amplificam aquilo que já existe num cérebro de forma latente?

Resposta: Sim. Elas não criam do zero a vulnerabilidade, mas amplificam-na e aceleram-na. O cérebro, sobretudo em adolescentes, ainda está em desenvolvimento e é particularmente sensível a recompensas rápidas, a reconhecimento social imediato. As redes sociais fornecem isso de forma incessante.

Pergunta: Então, como podemos proteger as gerações mais novas (e a nós próprios) desse efeito?

Resposta: Uma parte da resposta passa por literacia digital, por ajudar jovens e adultos a compreender como funcionam os algoritmos e como podem manipular a nossa atenção. Mas há também um aspecto psicológico e cerebral: fortalecer a flexibilidade cognitiva, treinar a capacidade de tolerar a incerteza, cultivar o pensamento crítico. Se conseguirmos desenvolver essas competências, estaremos mais bem
preparados para resistir ao apelo das respostas absolutas que as ideologias extremas oferecem. E isso pode ser trabalhado tanto em contexto educativo como familiar, ajudando as pessoas a lidar com a complexidade em vez de fugirem dela.

Pergunta: Ou seja, a chave é combinar conhecimento social com compreensão científica do cérebro.

Resposta: Precisamente. É ao integrar estas duas perspectivas — a social e a neuropsicológica — que conseguimos uma visão mais completa. Só assim poderemos criar estratégias eficazes para fortalecer a resiliência individual e colectiva contra o extremismo ideológico.

Pergunta: Voltando àquela questão da maior ou menor capacidade de absorver informações…

Resposta: A informação é aquilo que circula mais rapidamente e de forma mais popularizada, e parece que os algoritmos que ditam que conteúdos, informação e entretenimento as pessoas recebem estão exactamente focados em criar essa informação mais radicalizante para as mentes mais vulneráveis.

Leor Zmigrod faz o que lhe compete: estuda, investiga e partilha conhecimentos. O que diz em relação às pessoas, em especial, os jovens e os adolescentes, cabe depois aos educadores, aos pedagogos, aos professores, tecerem estratégias de intervenção a partir das suas artes, do seu trabalho nas escolas e nas salas de aula. Que a confiança lhes seja dedicada na justa medida que necessitam. Ninguém mais que os próprios professores deseja habilitar os alunos em aprendizagens e capacidade de decisão pessoal, com as velhas e as novas ferramentas de ensino e aprendizagem.

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sábado, setembro 20, 2025

#TOLERÂNCIA265 - O SILÊNCIO. CRIANÇA, ERA OUTRO... GANHEI OU PERDI?

 #TOLERÂNCIA265 - O SILÊNCIO. CRIANÇA, ERA OUTRO... GANHEI OU PERDI?

O pequeno poema de Fernando Pessoa, completo, é assim:

«Criança, era outro…
Naquele em que me tornei
Cresci e esqueci.
Tenho de meu, agora, um silêncio, uma lei.
Ganhei ou perdi?»

Tanto que aprecio este poema de Pessoa! Aos educadores e aos professores, e aos psicoterapeutas, o poema lança um interessante e poderoso desafio.

A razão da caminhada de hoje é a convicção que tenho de que o silêncio alimenta a tolerância positiva. Atenção! Estou a falar do silêncio pessoal interior, o silêncio, como escreveu Maria Montessori, que «afina a nossa sensibilidade. Quando ficamos em silêncio não só podemos ouvir com maior atenção a palavras do outro, por isso conseguindo “alcançá-lo”, mas também somos capazes de captar a realidade que nos envolve. Então, é importante deixar que a criança possa viver esta realidade, preservando para ela uma relação de acolhimento e ajuda.» É conhecida por todos os pedagogos montessorianos a sua "Lição do Silêncio".

Num 'site' dedicado à pedagogia montessoriana, alguém escreveu esta frase muito bonita, não sei se

citando a própria Maria Montessori: «O silêncio é o sossego dos sentidos.»(1)

Voltando à minha convicção, penso que, quanto mais sossegado cada um estiver com o seu silêncio-lei, tanto mais disponível e tolerante estará para o Outro. E que fique claro: uma coisa é o silêncio interior, que reduz o potencial agressivo no contacto com o Outro; outra coisa é o silêncio pessoal perante as ocorrências injustas e lesivas das outras pessoas. Se o primeiro é para cultivar, o segundo é para eliminar.

Do ponto de vista pedagógico, o que me estimula e espicaça é o desejo de criar actividades de dinâmica de grupo em que se promova, aprofunde e consolide o silêncio-lei-interior em interacção e comunicação uns com os outros. Actividades que não sejam caracterizadas pela passividade, mas pela mobilização individual, esforçada, de cada participante na actividade. A compreensão do silêncio como um instrumento pedagógico eficaz exige uma mudança de paradigma, passando da sua interpretação, repito, passiva para o reconhecimento do seu poder como um elemento activo no desenvolvimento pessoal e na comunicação interpessoal.

Nos dias que correm, em todo o lado, as vozes, os gritos, os barulhos, os ruídos, crescem em escalada simétrica, muito se ganharia se cada um reduzisse um decibel que fosse na voz e eliminasse uma fala por dia.

O silêncio intencional, produzindo uma pausa, pode ser tão ou mais poderoso do que as palavras. Ao contrário do silêncio vazio, passivo, não comprometedor, o silêncio-pausa bem executado demonstra segurança, controlo e domínio na comunicação verbal — autodomínio e domínio na interacção com o Outro, promovendo a reciprocidade. No breve instante da pausa, as informações que acabam de ser transmitidas ou trocadas são valorizadas, e o ouvinte (cada um à vez) tem a oportunidade de reflectir e processar a mensagem recebida. Cria-se uma expetactiva sobre o que virá a seguir, e a comunicação mostra o seu encanto, fortalecendo a conexão entre os interlocutores.

Antes de me virar para a congeminação dos jogos, um último alerta por agora: se queremos que o silêncio silêncio seja um recurso pedagógico activo e poderoso, será que devemos usar i silêncio como recurso ou estratégia de castigo ou punição? Vou guardar a pergunta, quando puder volto a ela e não deixarei de dar a minha opinião.

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(1) https://www.criancasindependentesmontessori.com/post/a-aula-do-sil%C3%AAncio-montessori

sexta-feira, setembro 19, 2025

#TOLERÂNCIA264 - AS ABELHAS E O HUMOR

 #TOLERÂNCIA264 - AS ABELHAS E O HUMOR

O humor está para a liberdade democrática como as abelhas estão para os ecossistemas do Planeta Terra.

Nas aulas de apresentação da disciplina de Cidadania e Desenvolvimento (4 turmas, duas do 7.º ano e 2 do 9.º), falei das abelhas e das consequências para os ecossistemas da Terra se elas desaparecerem completamente por causa dos incêndios e de outras actividades humanas: as consequências são desastrosas.

Num certo sentido, podemos dizer que o humor na sociedade e na Política é como as abelhas nos ecossistemas: dão-nos picadas, dão-nos ferroadas, mas é para nosso bem, é para bem da democracia.

Há pessoas que não têm sentido de humor, que não toleram uma piada, e entre estas pessoas há muitos políticos. Exagerarão por vezes os humoristas? Sim, é claro que sim, mas apetece rematar que, neste campo, antes demais do que de menos. Que os políticos se zanguem com os humoristas, mas que não os calem.

Por isso, quando políticos têm o poder de calar os humoristas e os jornalistas-humoristas e o exercem isso é mau para os ecossistemas sociais e políticos. Ora, se quanto aos regimes políticos repressivos e ditatoriais não dizemos nada, quando isso acontece em regimes tradicionalmente não-repressivos e não-ditatoriais, nestes casos, deve soar o alarme.

Neste caso recentíssimo dos EUA, em que o 'talk-show' de Jimmy Kimmel, do canal ABC, foi suspenso por pressão do Presidente Trump, o caso caso é especialmente grave. Ao cidadão comum parece evidente que o Presidente dos EUA quer ter um poder autoritário, absoluto e discricionário que ele vê outros líderes mundiais terem nos seus países. A mim não me aflige que ele o queira ter, o que me aflige é que ele vai obtendo esse poder com a anuência de cada vez mais gente. Pior! Com a cedência da Imprensa e dos Órgãos de Comunicação Social, que parece que aceitam passar a dizer o que for aceitável para o Grande Ditador. Sem as ferroadas das abelhas, os ecossistemas da Liberdade de Expressão e da Imprensa Livre precipitam a corrosão dos sistemas democráticos dos países.

Na edição de hoje, o "The Guardian" traz um artigo que enumera algumas ocorrências recentes, pela escrita de Oliver Holmes. O primeiro terço do artigo diz assim, sob o título: "Líderes Amordaçados que não sabem aguentar uma piada"

«O comediante egípcio exilado Bassem Youssef sentiu na pele como a sátira política pode ser silenciada. E tem uma mensagem curta para aqueles que vivem numa era de repressão à liberdade de expressão de Donald Trump: "Meus Queridos Cidadãos Americanos", escreveu no X. "Bem-vindos ao meu mundo".

»Nos seus ataques aos satiristas americanos mais proeminentes, o presidente dos EUA juntou-se a um grupo de líderes iliberais em todo o mundo que não toleram uma piada. O alvo mais recente do que os críticos dizem ser uma campanha para silenciar vozes dissidentes foi Jimmy Kimmel, cujo programa de entrevistas nocturno da ABC foi suspenso após pressão governamental.

»A remoção, semanas depois de a rede rival CBS ter cancelado o programa satírico de Stephen Colbert, segue-se a outras repressões lideradas por Trump. Opositores políticos do presidente norte-americano afirmam que o espaço cada vez menor para a liberdade de expressão mostra que a América de Trump está a avançar para o autoritarismo.

»O senador Bernie Sanders, em declarações à MSNBC, afirmou que o país está num caminho para se tornar mais parecido com regimes opressivos como os da Rússia e da Arábia Saudita. "Isto é apenas mais um passo em frente", disse. "Estamos a tentar unir o povo americano contra a oligarquia, contra o autoritarismo".

»Desde o chefe da junta militar egípcia Abdel Fatah al-Sisi até ao primeiro-ministro nacionalista da Índia Narendra Modi, as gargalhadas muitas vezes terminam à medida que a democracia definha.»

E o jornalista vai, então, por aí fora enumerando outros casos.

Vêm-me à cabeça as estações desta minha saga, lá muito para trás, em que junteiei, com a ajuda da Internet, algumas piadas para usar em actividades de dinâmica de grupo de promoção da Tolerância. É verdade, em boa hora o fiz.

Já uma ou outra vez sugeri aqui um ou outro tema de tese de Psicologia ou de Sociologia. Talvez este seja mais um: estudar o passado escolar e o passado de vida dos líderes dos países e compará-los. Uma questão a investigar: será que os líderes governativos mais "iliberais" (como diz Oliver Holmes) eram

crianças que se riam menos, que não gostavam de piadas, que eram gozados pelos amigos e colegas? Podia especular aqui com outras perguntas, mas o texto já vai longo.

Por cá, felizmente a grande parte dos políticos ainda deseja ardentemente ser convidado para o "Isto é Gozar com Quem Trabalha", do Ricardo Araújo Pereira, na SIC, nas alturas dos processos eleitorais. Que neste programa e noutros nunca deixe de ser assim. E acredito que o Ricardo Araújo Pereira já tenha sido pressionado para levar lá um certo líder político, mas ele continua a não querer fazê-lo. Se um dia o levar lá, que seja por sua livre vontade.

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quinta-feira, setembro 18, 2025

#TOLERÂNCIA263 - COMO SE EDUCA PARA ISTO NA ESCOLA?

 #TOLERÂNCIA263 - COMO SE EDUCA PARA ISTO NA ESCOLA?

O último parágrafo dum longo artigo na edição do "Le Monde" de hoje, com o título "Em Gaza-Cidade, o medo de uma fuga sem regresso - Israel destrói metodicamente a maior cidade do território, forçando os habitantes a um êxodo em massa" , diz assim: "O lançamento da ofensiva [militar] terrestre [na cidade de Gaza] suscitou condenações internacionais, sem sanções concretas contra Israel. O secretário-geral da ONU, António Guterres, lamentou uma situação «moralmente, politicamente e legalmente intolerável» em Gaza. Uma comissão de inquérito da ONU acusou, na terça-feira (16SET2025), Israel de cometer um genocídio no território. «Não precisamos de vocabulário adicional para enriquecer a nossa história de sofrimento. O que precisamos é de acção que ponha fim a este genocídio, a esta limpeza étnica e a esta fome», afirmou Rami Abou Jamous, a partir da cidade que se recusa a abandonar."

Imediatamente comecei a magicar uma maneira de promover a aprendizagem discriminativa entre os 3 tipos de tolerância invocados pelo Secretário-Geral das Nações Unidas... Uma coisa é apresentar as definições aos alunos, outra coisa é levar os alunos a descobri-las: a senti-las e a entendê-las. Evidentemente, prefiro a alternativa de eles as descobrirem. Passei ao trabalho e agora já tenho alguns materiais. Para um primeiro esboço, não está nada mau.

Entretanto, antes de ler o jornal, eu já tinha, ao almoço, falado com colegas meus acerca da necessidade de levarmos para a escola, para os projectos ligados à Cidadania (o Parlamento dos Jovens, o Euroscola, o Escola Embaixadora do Parlamento Europeu; e a disciplina de Cidadania e Desenvolvimento), a questão da Palestina e do Povo Palestiniano.

Já sozinho, como penso que nós, professores, devemos fazer sistematicamente, perguntei-me até onde vai a minha legitimidade para levar os jovens a pensarem nas atrocidades que o Governo e o Exército de

Israel estão a cometer na Faixa de Gaza. E mesmo que encontre legitimidade, tenho de me perguntar «E qual é a utilidade?»

Consegui clarificar na minha cabeça um pensamento: andamos constantemente a dizer que o Futuro é dos Jovens e que os Jovens são o Futuro. Ora, a construção e a Defesa e do Futuro está já a ser feita, vai-se fazendo todos os dias. Como é, envolvemos os jovens a sério, ou não?... Nas escolas banalizou-se o momento do minuto de silêncio. Antes faz-se uma pequena evocação, a seguir guarda-se o minuto e depois bate-se palmas... Que ganho, que aprendizagem estes momentos proporcionam aos alunos? Pessoalmente, tornei-me, com o tempo, cada vez mais descrente.

Fui aos papéis. Fui aos textos centrais da União Europeia. O Tratado da União Europeia (TUE) e o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE) são os dois tratados fundamentais da UE, que definem a estrutura, os objectivos e o funcionamento da União. O TUE define os princípios gerais, valores e objetivos da UE, enquanto o TFUE detalha as competências da União e as regras para as suas instituições, sendo derivado do Tratado que instituiu a Comunidade Europeia (TCE). Ambos foram significativamente alterados e consolidados pelo Tratado de Lisboa, que entrou em vigor em 2009. A versão consolidada actual é de 7 de Junho de 2016.

Ora bem, o n.º 5 do artigo 3.º do capítulo das Disposições Gerais diz assim: "Nas suas relações com o resto do mundo, a União afirma e promove os seus valores e interesses e contribui para a protecção dos seus cidadãos. Contribui para a paz, a segurança, o desenvolvimento sustentável do planeta, a solidariedade e o respeito mútuo entre os povos, o comércio livre e equitativo, a erradicação da pobreza e a protecção dos direitos do Homem, em especial os da criança, bem como para a rigorosa observância e o desenvolvimento do direito internacional, incluindo o respeito dos princípios da Carta das Nações Unidas."

Por outro lado, o Relatório apresentado ao Conselho dos Direitos Humanos, na sua Sexagésima sessão (Análise jurídica da conduta de Israel em Gaza, nos termos da Convenção para a Prevenção e Punição do Crime de Genocídio), pela Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre o Território Palestiniano Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental, e Israel, no passado dia 16 de Setembro de 2025, afirma que o Povo Palestiniano está a ser vítima do crime de Genocídio.

O consenso formal do primeiro documento e a idoneidade avaliativa do segundo; e os objectivos de Formação para a Cidadania dos projectos escolares que referi, juntos, dão-me (dão-nos) legitimidade para fazer qualquer coisa na escola. O desafio passa a ser a estratégia pedagógica que sirva os propósitos da Educação.

Tenho uma ideia de como começar... De começar respeitando o direito de todos os alunos de quererem pensar o que quiserem acerca do que se passa em Gaza; e de pura e simplesmente não quererem pensar em nada. Não, não quero endoutrinar, não quero catequizar, não quero converter ninguém. Não quero, nem tão pouco tenho legitimidade para o fazer.

Desde que começámos hoje ao almoço a ruminar estas coisas, juntámos já professores de 3 escolas diferentes do País. Como diz o tal ditado africano: «Sozinhos vamos mais depressa, juntos vamos mais longe.» Vou partilhar as minhas ideias com os meus colegas.

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