#TOLERÂNCIA197 - TOLERÂNCIA E TEMPERANÇA
Jean-Pierre Demange é um psicólogo francês, especialista em adictologia, com uma longa carreira na intervenção clínica médico-social. Conheci-o durante a pandemia, participando em webinares internacionais animados por ele e, em Portugal, pelo psiquiatra Luís Patrício.
O nosso contacto foi-se aprofundando e foi-se enchendo de afecto que ambos prezamos. Ele tem um sentido de humor desarmante que obriga os seus interlocutores a pensar e... e a rirem-se. É exigente consigo mesmo e também com os outros "psi's", sejam do lado da Psiquiatria ou da Psicologia.
Assume que as suas referências teóricas são W.R. Bion, D.W. Winnicott, J. Bergeret e F. Roustang. Conheci-o já ele era presidente da rede europeia T3E (Toxicomanies-Europe-Echanges-Etudes).
É cidadão de intervenção activa, e fez parte do grupo internacional que o dr. Luís Patrício conseguiu juntar em Mação após os trágicos incêndios de 2017, com o objectivo de chamar a atenção dos governantes portugueses, e do Mundo, para a bem sofrida região; e, por outro lado, foi também uma maneira de promover a revitalização de algumas actividades económicas locais, nomeadamente as ligadas à hotelaria e à restauração. Nessa altura, a rede T3E, já liderada por Jean-Pierre Demange, envolveu-se nessa iniciativa, que foi designada por "I Encontro Internacional de Solidariedade Intergeracional", que teve lugar, então, em Mação, em Setembro de 2018. Depois aconteceu o II Encontro em Setembro de 2023.
Por último, teve lugar o III Encontro de Solidariedade Intergeracional, que acaba de acontecer, nos dias 11 e 12 deste mês.
Foi neste Encontro que, como deixei escrito nos 3 últimos relatos desta saga, fui falar da Pedagogia da Tolerância. Jean-Pierre Demange já tinha feito parte do pequeno grupo que, num dos webinares em francês que à volta da T3E se têm vindo a realizar, me ouviu falar da Tolerância.
Já nessa altura, o meu colega psicólogo falou da sua preferência do conceito de Temperança em vez da centralidade do conceito de Tolerância. Agora, em Mação, no dia 12, depois de outra vez me ouvir, outra vez me sugeriu especial atenção à ideia da Temperança. No jantar celebrativo que ainda nesse dia fizemos, prometi-lhe que tão depressa quanto me fosse possível, me ocuparia da Tolerância e da Temperança. Aqui estou a cumprir a promessa.
De acordo com o "Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa", de José Pedro Machado, a raiz de "temperança" (uma virtude ou qualidade) encontra-se no verbo latino 'tempĕräre', que entre os seus significados incluía os de "moderar, temperar, equilibrar".
Quanto à Tolerância (uma qualidade), mesmo que numa das primeiras etapas desta viagem eu tenha parado na estação da etimologia da Tolerância, e de maneira a facilitar a comparação entre ambos os conceitos, junto o que o mesmo dicionário de José Pedro Machado diz acerca da Tolerância: s. Do lat. 'tolerantĭa', «constância a suportar, resistência; paciência»
Vamos então fazer a abordagem exploratória, a primeira, acerca da Temperança e da Tolerância e do que uma pode ter a ver com a outra; e, finalmente, o que as distingue ou contrasta.A temperança e a tolerância são "qualidades" que se caracterizam pelo equilíbrio e moderação que ambas exigem — esta é, portanto, a primeira forma por que se relacionam. O que as distingue ou contrasta será o domínio de actuação: a Temperança é uma qualidade que a pessoa faz actuar de si para si-própria, ao passo que a Tolerância é (nesta altura da viagem já sabemos que estou a falar apenas da forma mais elementar de Tolerância) uma qualidade que a pessoa faz actuar de si para os outros. Podemos dizer "autodomínio 'versus' relacionamento".
A Temperança refere-se ao controle sobre os próprios apetites, desejos e impulsos, especialmente em relação a prazeres excessivos (como comida, bebida ou luxúria); e das emoções e sentimentos.
A Tolerância refere-se à capacidade de aceitar diferenças nos outros, mesmo quando discordamos ou nos incomodam.
A moderação é o princípio que desafia a Temperança e a Tolerância. No caso da Temperança, procura-se moderar o excesso, o desbragamento; ou a repressão excessiva, espartana e inibidora de motivações, desejos e apetites legítimos. No caso da Tolerância, procura-se moderar as reacções impulsivas de rejeição de opiniões, comportamentos, pessoas e grupos de pessoas (assim promovendo a discriminação e a exclusão); ou de aceitação absolutamente passiva, permissiva e conivente, sem sentido crítico, da arbitrariedade e os excessos dos outros.
Pode-se dizer que sem temperança uma pessoa pode reagir com raiva, sarcasmo ou intolerância. Entretanto, com temperança a mesma pessoa consegue conter a impulsividade, reflectir, escutar — e, assim, praticar a tolerância com mais autenticidade.
Como primeira conclusão da primeira incursão, exploratória, na estação da relação entre a Temperança e a Tolerância, proponho assumirmos que a temperança é um alicerce do equilíbrio psico-afectivo, interno, da pessoa, alicerce que tem em si o precioso potencial de fortalecer a expressão da tolerância na dinâmica sócio-afectiva, externa, da pessoa com os outros.
Sem a moderação da temperança, a tolerância torna-se um esforço muito mais difícil. Será que o meu estimado amigo Jean-Pierre Demange concorda que eu diga que a temperança é a disciplina interna que capacita a aceitação externa que é a tolerância?
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