Comecei por desejar que ele não ganhasse a Volta a França. País de extremos, cultura de extremos, pessoas de extremos, o saldo dos meus sentimentos é desfavorável aos americanos.
Depois, soube da história do cancro do ciclista americano - numa altura que eu ainda muitas incertezas tinha com o futuro do meu. Contar a sua história a um velho amigo, que eu adorava como a um pai, fez-me bem e, sobretudo, fez bem ao meu amigo, o qual, enquanto o seu terrível cancro o deixou, voltou a mostrar-nos o sorriso da esperança. E ele tanto gostava de sorrir e fazer-nos sorrir! Então, passei a desejar que Lance Armstrong ganhasse a Volta à França.
Voltei depois a deixar de gostar dele. Quando ele começou a ganhar muitas vezes. Não gosto de competidores - individuais ou coletivos - que estão sempre a ganhar! O mesmo aconteceu, por exemplo, com o Barcelona. A história política da Catalunha fez-me escolher o Barcelona como clube de futebol estrangeiro de eleição. Deixei de gostar do Barcelona quando ele começou a repetir - vezes demais, repito, para o meu gosto... - as vitórias, nos campeonatos e nas taças em que entrava.
Ora bem, gostar é uma coisa; acreditar é outra. E eu sempre acreditei em Lance Armstrong: no seu poder físico, na força das suas motivações, na verdade das suas palavras.
Perante a expetativa do que iremos ouvir na entrevista a Oprah Winfrey - faço questão de escrever isto antes de o ouvir -, tomando como fiável o que tem sido dito pela comunicação social nas últimas horas (que apontam para a confissão pessoal) peguei hoje, outra vez, no seu livro "It's not about the bike - my journey back to life", e folheei-o. Sei lá o que procurava nele... Talvez uma razão para justificar o que parece que está aí para vir: a sua confissão. Depois de tão veementemente, com o seu poder físico, com a força das suas motivações, com a assertividade das suas palavras ter negado todas as acusações que lhe fizeram. Não sabia mesmo o que queria procurar no livro...
Mas acabei por encontrar uma razão justificável:
Na dedicatória, podemos ler "This book is for: (...) Luke, the greatest gift of my life, who in a split second made the Tour de France seem very small. (...)"
http://www.zimbio.com/photos/Lance+Armstrong/ Luke+Armstrong/2005+Tour+de+France+Stage+ Twenty+Time+Trial/0vic-k5GJWU |
The louder he cries, the more I smile."
É, o filho pode ser a grande razão desta tão antecipada confissão. Sim, a formação dos valores humanos num filho pode justificar claramente o comportamento de confissão de Lance Armstrong. O atleta estava perdido; provavelmente, o cidadão também. Seguramente o pai também estava.
Um comportamento de confissão, a favor da verdade, da lealdade, da honestidade, salva sempre o cidadão e o pai. Como diz o ciclista na dedicatória do seu precioso livro, ao lado de um filho e do seu desenvolvimento como pessoa, as coroas de louros nos pódios da Volta a França pouco ou nada valem.
Não sei se terá sido esta razão que moveu agora Lance Armstrong. Digo apenas que me parece uma boa razão, se calhar, a mais razoável de todas.
Um abraço de muita saudade ao Ramos!
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