domingo, março 31, 2013

Um pensamento para esta Páscoa

http://ventor.blogs.sapo.pt/63608.html
Foi em José Saramago que tomei contacto com a afirmação de Pitigrilli (Dino Segre, pseudónimo) que diz que "O homem é o único animal que consegue distinguir a água benta da água da torneira". Esta afirmação, que choca tanto crente em Deus e em Cristo, parece-me oportuno recordá-la hoje, num dia de celebração tão antiga na nossa cultura.
Mais do que nunca, o homem - os homens poderosos, sobretudo - vivem negando a espiritualidade tremenda que pode ser vislumbrada na afirmação de Pitigrilli. O comportamento de tantos confirma a condição animal, bruta, de que somos feitos; e que apenas o esforço da tradição, da cultura e da educação renovadamente tenta que consigamos, enquanto espécie, enquanto seres gregários, ir um pouco mais além.
Os dizeres bíblicos são, no fundo, bem mais radicais do que a afirmação de Pitigrilli pode apontar.
"Pulvis es, tu in pulverem reverteris: Sois pó, e em pó vos haveis de converter. Sois pó, é a presente; em pó vos haveis de converter, é a futura." relembra o Padre António Vieira (Sermão de Quarta-Feira de Cinzas). Que radicalismo maior pode, na verdade, haver do que este?
A capacidade de simbolização que a frase de Pitigrilli implica é o extraordinário recurso do Homem para ir além da sua condição física essencial. Que o Padre António Vieira esgrime a propósito dos pensamentos e das verdades de Aristóteles. Mais uma vez, como ainda há dias citei a propósito da morte do padre José Fernando, vale bem a frase que um dia Fernando Pessoa ouviu a alguém com quem se cruzou à mesa de um café: "Assim é a vida, mas eu não concordo."
Quantos dos homens que abominam Saramago, que renegam a animalidade recordada por Pitigrilli, e que se benzem enfaticamente depois de tocarem, com gesto lento e delicado, na água benta da pia da igreja; dizia eu, quantos desses homens tratam o Próximo (no mais pleno sentido dos mandamentos das Tábuas do Antigo Testamento) com a mais voraz das animalidades?... Cada vez mais selvaticamente.
Estou curioso, à espera de  ver como o Papa Francisco vai tocar neste estado de coisas...
Mas que os comuns dos mortais não fiquem à espera. A luta de muitos milhares de homens, há muitos milhares de anos, continua a ser o principal fautor das transformações no sentido de melhores condições de vida para um cada vez maior número de seres humanos.

quinta-feira, março 28, 2013

"Um senhor de Matosinhos", de Vasco Graça Moura

Com os textos que em tão pouco tempo pude ler sobre Óscar Lopes, era impossível não procurar - pois não o conhecia - o poema de Vasco Graça Moura sobre Óscar Lopes. Os textos que me "obrigaram" à leitura, 2 são de Baptista-Bastos (Um homem maior do que o seu tempo e Um senhor português) e o terceiro é do próprio Vasco Graça Moura (Fazer filosofia).



um senhor de matosinhos

andava eu no liceu: no salão nobre
dos paços do concelho em matosinhos,
um professor, o óscar lopes, vinha

mostrar à noite que a literatura
importa a toda a dignidade humana.
iam autores ouvi-lo, jornalistas,

estudantes, gente que ali morava
e outra que do porto em carro eléctrico,
o “um” para leixões, o “dezasseis”,

passando à carvalhosa, vinha sempre,
lá estavam joão guedes, tonitruante,
e júlio gesta, afável e risonho,

manuel dias da fonseca, mais calado,
augusto gomes e suas lentes grossas
a enevoar-lhe o olhar de ver as praias

rasas de cinza e luto, com vareiras
por trágicos naufrágios ululando,
o egito, que então já se escrevia

com os poetas todos deste mundo,
o eugénio, de cachecol esvoaçante,
a modelar os gestos e os ditongos

medindo mãos e frutos, depurando
sílaba a sílaba, a sua incandescência
devia ser outono, ou mesmo inverno,

e fazer frio, e não faltava um torpe
sujeito de soslaio e bloco-notas,
tomando apontamentos com minúcia,

que a subversão quanto mais culta mais
impalatável era. fuzilavam-no
amigas minhas com o olhar, ficavam

mais belas só por essa exaltação
contida e faiscante de amazonas,
foi quando eu soube que as mulheres sabiam

resistir por instinto e se tornavam
mais agilmente elásticas no corpo,
mais livres e arriscadas nos seus gestos,

e no limite a cor afogueava-as,
e tão fulva energia em nenhum verso
coube jamais, que eu saiba, então na sua

voz calma e portuense, óscar falava
dos livros, dos autores, como quem trata
de assuntos de família e os desarruma

para os mostrar melhor, e acontecia
que isso era irrepetível e sem pompas,
como outra intimidade ao nosso alcance:

é sempre desconforme a literatura.
é mal-estar, princípio de prazer,
é trabalho forçado e liberdade

e um modo mais verbal de estar no mundo,
e nesse mar óscar lançava as redes
da pesca milagrosa, aquela terra

tinha essas tradições mais literais,
orlas de oralidade e maresia,
e embarcávamos todos na traineira

e era outra vez o senhor de matosinhos
com ex-votos à roda: impaciências
de passado e presente na palavra

e, entre a vida e a morte, o seu fulgor
em que, por crespas ondas, falar era
também filosofar e rebeldia.

tinham saído alguns discos recentes,
gravados por poetas: eu recordo
a voz do régio num, que achei roufenha

dos ensimesmamentos presencistas,
e vozes de combate que também
prestavam para pouco, mas sabia

tão bem partir a louça no salão
daquela edilidade, assim nas barbas
de toda a gente, era porém mais justa

a medida de que óscar nos falava
pois fazia pensar e punha em causa.
e alguém pedia às vezes um poema

quando a noite avançava e alguém dizia
outras coisas em código e ficavam
depois pequenos grupos à saída

como em cinemas de província, como
quem tem mais a dizer e veio vindo
devagar até aqui e aqui se encontra,

à espera de outro eléctrico ronceiro,
e vai falando tempos esquecidos,
sem pressa e sem vontade de ir embora.

Vasco Graça Moura, Uma Carta no Inverno, Quetzal Editores, 2.ª ed., 1999

quarta-feira, março 27, 2013

Assim é a vida, mas eu não concordo.

O padre José Fernando, no hospital do Fundão,
no dia 20 de fevereiro de 2011, a partilhar memórias
com um velho companheiro de seminário;
essas memórias estariam também à disposição
de toda a gente, no livro que publicou pouco depois.
«"Assim é a vida, mas eu não concordo." Foi esta a frase e eu só queria, ao relembrá-la a glória de a poder ter inventado.»
Quem um dia assim escreveu foi Fernando Pessoa, que a ouviu "a um homem que não sei quem é". Diz ele um pouco mais à frente que "É a história inteira da humanidade nas suas relações com a Natureza.". 
O padre José Fernando tinha esta rebeldia. Acompanhei-o muitas vezes às dececionantes consultas de oncologia que sempre, sempre, sempre, o avisavam que ele não tivesse ilusões - ele era um homem com uma doença em evolução. Mas o padre José Fernando não concordava que a sua vida fosse assim - porfiava perante a descrença médica, quase arrancava para si os tratamentos que era preciso ousar. Um dia, os exames mostraram que os assassinos nódulos estavam a dar de si. A voz que teimava em avisá-lo que não se deixasse levar por ilusões sorriu pela primeira vez e perversamente reclamou o triunfo para si: "Estamos a ganhar esta guerra, senhor padre!..." Desta vez foi o padre José Fernando que olhou os olhos da difícil voz e respondeu tranquilamente: "Eu sei onde vou chegar, mas, até lá temos de ver o que se consegue fazer ainda."
No mesmo escrito em que Fernando Pessoa escreveu a notável frase, ele regista uma outra, que relembra de ter ouvido a "outra mulher a um portal de casa por onde passei: «Ora ele morreu lá disso. Ele morreu, mas foi de ter que morrer!"»
Sim, o padre José Fernando sempre soube muito lucidamente que assim é a vida, mas ele não concordava. E nesta rebeldia contra o destino que nos leva a saúde e a vida, ele deu-nos sempre o exemplo do inconformismo que as coisas difíceis da vida precisam. A felicidade não existe na aceitação, mesmo que serena, do que nos está destinado; a felicidade faz-se na sabedoria ousada com que lidamos com o que nos está destinado em sorte, a bem da nossa paz e bem-estar; e a bem da paz e bem-estar dos que estão à nossa volta.
Abraço rijo, amigo-irmão!

terça-feira, março 26, 2013

A lição dos amigos


A lição dos amigos
O Luís, sim, esse, o que se sentia no fundo do poço e a irmã desafiou a cavar ainda mais fundo, tem 3 filhos. Um deles é um rapazinho.
O breu do poço de onde o Luís saiu a pulso firme deu lugar à luz franca dos horizontes abertos; do trabalho e das relações pessoais positivas. A vida do jovem e integrado cidadão ganhou consistência, a pressão que quase impedia o fôlego deu espaço à folga que permitia o suspiro tranquilo.
O pai e a mãe do filho do Luís, num dia que a tradição diz que é de prendas para os miúdos – seria natal do Menino Jesus, ou natal do menino do Luís, não importa qual seria –, sentiam-se em condições de ir um pouco mais além na sofisticação do presente para o filho de ambos. Dois presentes, um do pai e um da mãe. Duas ideias, também, sobre o filho, uma do pai e outra da mãe. Dois objetivos também; sem querer, de boa-fé, ambos prendiam o filho ao brinquedo que ousavam para o filho, ambos arriscando a disponibilidade financeira da família. Mas o futuro era risonho e promissor; agora, nem uma réstia do breu difícil de tempos que se distanciavam cada vez mais.
Ignorando-se reciprocamente a início, num quase divertido jogo das escondidas, os brinquedos do pai e da mãe disputavam o filho:
a mãe escolheu um daqueles aparelhos modernos, sofisticados, de comandos à medida dos dedos ágeis infantis, que prendem as crianças, em casa, ao ecrã de televisão ou do computador;
o pai desafiou-se num pagamento a prestações, e comprou uma motoreta de quinhentos euros, que poria o filho na rua.
Estão todos juntos, é hora de os pais darem os presentes e do filho os desembrulhar.
A reacção do rapazinho ao presente do pai deixará adivinhar a reacção ao presente da mãe. O pai olha o filho, com ansiosa expetativa, enquanto ele desembrulha o presente. Sente-se bem, feliz de ter conquistado as condições para poder dar ao filho que tanto amava um brinquedo que simboliza a vida tomada nas mãos com algum desafogo. O jovem pai antecipa a alegria exuberante do filho, só não sabe se ele vai saltar primeiro para o selim da motoreta ou para o colo do pai.
Na hora de uma ou outra coisa acontecer, prenda completamente desembrulhada, o filho não faz uma coisa, nem a outra. O rapazinho mira quase indolentemente o magnífico presente.
Agora ansioso por outra razão, o pai pergunta ao filho:
- Então, filho, não gostas da mota?...
O miúdo tenta não desapontar o pai, mas também não consegue sentir, nem sequer fingir a alegria que o pai quer que ele mostre.
- Eu gosto, pai…
- Então, parece que não ficaste muito entusiasmado… insiste o pai, sem conseguir ver-se aliviado daquela ansiedade, à beira de se tornar numa deceção inesperada e indesejada.
O filho vira-se para o pai e, com a serenidade que expõe a sólida confiança e franqueza a que a educação dos pais levara já a personalidade em formação do filho, olha-o e diz-lhe:
- Ó pai, a mota é gira, mas não dá para o que eu quero…
- E o que é que tu queres, filho?... estranha o ansioso pai.
- É que a mota não dá para eu brincar com os meus amigos, pai… A mota é para eu brincar sozinho, só dá para um, e eu quero brincar com os meus amigos.
É isto a vida, é isto essa coisa extraordinária que é as relações que as pessoas são capazes de estabelecer umas com as outras. Este filho, com este sentir, sim, ele é que acaba sendo o verdadeiro presente – do filho para os pais, que – coitados! – tanto amor e tanto risco de si mesmos tinham posto nos presentes de valor que queriam dar ao filho.
Quanto vale, quanto custa, em dinheiro, o sentir espontâneo da amizade, do companheirismo, numa criança da idade do filho do Luís? Quanto mostra esta genuína forma de sentir do amor e dos valores recebidos pelo filho dos seus pais?
Numa perceção vertiginosa, o pai reviu as vicissitudes da sua própria vida, os afetos, as cumplicidades e os conflitos que o aproximaram e o afastaram dos outros, os amigos e a sociedade.
O Luís e a mãe do seu filho, o filho de ambos, seguramente se tornaram melhores pais, melhores pessoas a partir deste dia. E mimaram com redobrado carinho este filho precioso.
Quem, com esta história - história verdadeira -  não ficará a pensar sobre os presentes que já deu, que gostaria de dar e que vale a pena dar?

segunda-feira, março 25, 2013

NO FUNDO DO POÇO


NO FUNDO DO POÇO

O Luís foi ao fundo. Ao fundo da vida. Assim se sentia, no fundo do poço, por isso estava preso.
Rapaz novo, na idade a dezena redonda mais próxima ainda era a do dois e do zero – 20 anos.
O Luís.
Foi rebelde em puto, foi rebelde mais crescido; continuava a ser rebelde. Só que agora um desconforto o tomava. Tomava-o e vergava-o. Até que se tornou praticamente insuportável. O desagrado, o desconforto, agigantou-se tanto que sentiu que precisava de o extravasar.
Chegou-se um dia à irmã, mais velha, e contou-lhe tudo.
- No fundo do poço?... Sentes que estás no fundo do poço?... quis a irmã que ele claramente lhe confirmasse. Melhor ainda, que ele tomasse para ele consciência de que era ali mesmo que ele estava – no fundo do poço.
- Sim, no fundo… Mesmo no fundo!, confirmou o Luís, de cabeça baixa, incapaz de fugir à atração hipnotizante do breu do poço.
A irmã não lhe respondeu imediatamente, queria que as palavras fossem ouvidas e sentidas até à última reverberação.
- Olha, disse então, a pedir que o irmão pusesse os seus olhos nos dela, se estás no fundo do poço, escava ainda mais fundo, escava até onde puderes!... Quando acabares, e só quando não puderes cavar mais, crava aí as tuas raízes, faz que fiquem aí bem presas e seguras…
O irmão estava agora hipnotizado pelos olhos e pela boca da irmã, por causa da força e da convicção que deles saíam.
- Quando tiveres as tuas raízes bem presas e seguras começa a construir a tua vida assim, a partir de baixo, com toda a firmeza, com toda a força de que fores capaz!
O irmão, o Luís, compreendia que ouvia o que há muito teria sido bom ter sentido ou ter pensado. A irmã tinha razão! Mais!... Ele estava seguro que, com a força da irmã, com a convicção que ele mostrava no que dizia, não havia hipótese de ele falhar. Sim, ele iria ser capaz!
E foi. Até hoje. As palavras da irmã conservam ainda toda a força de então. E ele agora já não está na prisão. Fora dela, casou e tornou-se pai. Adora os filhos e dedica muitas horas da sua vida, com muita alma e muito coração, a tentar que outros, mais novos do que ele é agora, nunca venham a cair na prisão.
Ah! Continua a ser como era - rebelde! Como os jovens que protege e avisa.

ABRAÇO GRANDE, ZÉ FERNANDO!


ABRAÇO GRANDE, ZÉ FERNANDO!
O padre José Fernando da Cruz Lambelho, o Padre Motard, trouxe até hoje a sua luta tenaz pela vida, sempre contra um desafiante cancro que quis levar o Padre José Fernando logo com ele, assim que a terrível doença se declarou há alguns anos atrás. Hoje, há poucas horas, essa luta chegou ao fim.
Aqui longe, dos Açores, o que posso é desejar-lhe a eternidade da paz e da serena alegria que estas crianças cantam: o regresso para junto dos pais que o amaram e que ele amou.
Até sempre, querido amigo! Obrigado pelo tesouro de humanidade que deixaste na minha vida!



Releio, de memória, a dedicatória que escreveste no exemplar do teu livro, que tão simpaticamente - estavas tão esperançosamente feliz! - me ofereceste. Espero merecer, sempre, o coração franco, aberto, humilde, que mostraste nas palavras que recordo repetidamente.

domingo, março 24, 2013

SolidarISA na ESEQ, em 12 de março de 2013

APANHAR COUVES COM O SolidarISA.
Vamos ajudar estes jovens, amanhã, segunda-feira, dia 25 de março, no Instituto Superior de Agronomia. Num exercício de inteira liberdade pessoal.


terça-feira, março 19, 2013

DIA DO PAI, DE VOLTA EM 2013


DIA DO PAI, com dedicatória especial para os pais, avós e filhos que amam os seus filhos, netos e pais de maneira especialmente complicada. Plagiando o dr. Luís Patrício, "amar não é complicar".
Um abraço especialmente apertado a todos os meus filhos "in pectore". E ao meu pai.


Os Dias disto e daquilo são ocasiões celebrativas que visam alertar, agradecer, fazer pedadogia.
Tendem a extremar os os sentimentos despertados, seja idealizando as imagens mentais, seja acentuando as vivências tristes associadas.
O Dia do Pai é dos que mais dificilmente escapa a este efeito de acentuamento dos pensamentos e dos afetos.
Resolvi, desta vez, trazer - por variadíssimas razões, de que falarei se vierem a propósito - um trecho de Rómulo de Carvalho, sobre o seu próprio pai, num livro de memórias que ele escreveu para os "queridos filhos dos netos dos meus netos":

"Dir-se-ia, ao vê-lo, que era um homem indiferente, insensível ao que se passava em seu redor. Raramente falava. Quando estava acordado preparava-se para dormir. Não tinha uma conversa, não trocava uma opinião. Talvez sentisse acanhamento em fazê-lo e se envergonhasse de descobrir os seus sentimentos. Se houvesse telefone, no tempo, talvez fosse capaz de, por ele, dizer que nos estimava muito a todos e que eram [penso que o autor quereria escrever "era"] muito nosso amigo. Depois desligava. Só de longe, e encoberto, se atreveria a isso. Não me recordo que me fizesse nenhuma carícia, mas um dia ele teve que ir a Évora, e de lá mandou uma carta, e dentro da carta vinha um poema, um acróstico, dactilografado, dirigido a mim, que era seu filho querido, e que tinha sete anos. Era assim o poema:

R apaz vivo e inteligente,
O enlevo de toda a gente,
M enos de oito anos tem,
U m eterno falador,
L endo sempre com amor
O livro que à mão lhe vem.

Repare-se como as primeiras letras dos seis versos formam o meu nome, e o texto decorre sem esforço, fluente e bem ritmado, tudo sinais de viva sensibilidade. Mas, embora enviasse os versos por carta, de longe, não teve mesmo assim coragem para acrescentar o seu nome ou o seu título de pai por debaixo do que escrevera. Mas mandar aquele papel, assim, sem mais nada, também não lhe parecia correcto. Teve uma ideia, escondido atrás dela, sentiu-se então capaz de manifestar o seu amor pelo filho que muito estimava. Assinou; "Votre Père". Conservo esse papel."

Eu avisaria: o que é certo é que Rómulo de Carvalho se veio a tornar, certamente por esta e por outras, no suave poeta António Gedeão.