Hoje de manhã, pois claro, um dos canais generalistas da televisão portuguesa, apresentou imagens da noite que passou, mostrando várias cidades inglesas, focando bem o ferro e o fogo. Curiosamente, logo a seguir, no alinhamento do telejornal, veio o habitual noticiário dos movimentos de compra e venda nas principais bolsas europeias, notícias essas apresentadas com o tom de voz sempre monocórdico, de frases feitas, sempre iguais, absolutamente comuns a todos os canais que dão, todas as manhãs, informações sobre as ações que sobem, as ações que descem, os índices para cima, os índices para baixo.
No jogo que se sempre se joga nestas ocasiões, das causas próximas e das causas remotas deste tipo de acontecimentos, se calhar, sem querer, o canal de televisão em causa associou o efeito a uma das suas causas maiores, que nos mostra o estilo de vida dominante nas nossas sociedades: o movimento de capitais a pôr e a dispor das pessoas e das sociedades.
Repare-se no seguinte: os danos acumulados já devem chegar a valores que dariam para cobrir os orçamentos anuais dos centros de juventude que fecharam em Londres. Não estou a dizer que foi esta a causa precipitante, nem tão pouco que é a mais importante.
Não me canso de repetir o que o meu mestre João dos Santos muito sabiamente me repetiu, que, no fundo, o que importa na organização da vida das pessoas é a educação e a política. Ora, terão sido precisamente a educação e a política que falharam; que estão a falhar. Em Inglaterra e em todo o mundo.
Entre nós, portugueses, por exemplo, o grande desiderato da Educação é a melhoria dos resultados a Matemática, e quase se tem a vertigem de criar um deserto à volta dela, qual eucalipto voraz que absorve tudo avidamente.
Que sociedades, na história dos povos, conseguiu engrandecer com a desvalorização dos sábios da Educação, com a menorização dos seus professores?
É essa a desgraça dos tempos de hoje: os donos do dinheiro manietam os políticos, e os políticos desprezam os professores.
Curiosamente, também, na leitura matinal de hoje, li, precisamente depois de ver os noticiários:
"Podemos partilhar a saudade, entre todos os falantes da língua que se impôs como uma das maiores do mundo, veículo de muitas culturas, identidade comum. Pelo caminho houve muito sangue desperdiçado, muitos desastres ecológicos, muitos equívocos irreparáveis. Muitas pedras no meio do caminho. De todos esses desastres restam algures vestígios, uns indeléveis outros violentos, pelas veredas tortuosas que trouxeram até nós o poder de todas as paixões e a força de todas as utopias que se afeiçoam ao nosso destino. Com a língua partilhamos a saudade, com a saudade partilhamos o destino e com o destino partilhamos a utopia." (in Diário de Bordo, de António de Abreu Freire, apontamento de quinta-feira, dia 17 de maio de 2007, em Salvador da Bahia, no Brasil)A crise em que se inserem os acontecimentos de Inglaterra tem a ver, no meu entender, com o desprezo pelos valores da partilha, pelo deslaçamento das pessoas e dos grupos sociais, pela desistência das utopias coletivas. É o domínio absoluto do individualismo, casado, por intensa paixão, ao insaciável consumismo, que reclama satisfação imediata.
A responsabilidade última de tudo isto é sempre dos políticos e dos governantes.
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