sábado, agosto 27, 2011

No Kilimanjaro, há 4 anos, atingi, muito provavelmente, o zénite da minha vida

Por uma miríade de razões, pessoais e familiares, presentes, passadas e futuras, no dia 27 de Agosto de 2007 atingi, no topo do Kilimanjaro, no Uhuru Peak (o Pico da Liberdade), o zénite da minha vida.
De certa maneira, cheguei ao ponto intermédio entre a juventude e a velhice de que fala o poeta de língua swahiliShaaban Robert, no seguinte poema, que traduzi livremente. Para já, uma diferença me separa dos sentimentos do poeta: não sinto, nem de perto nem de longe, que a vida me tenha deixado preso na dimensão miserável da vida. Por isso, escreveria assim o penúltimo verso do poema:
esta vida pode bem ser uma coisa linda, mesmo que não consigas isto, podes conseguir aquilo.
Mas se me puser na pele da generalidade dos tanzanianos que conheci, e do nível de vida que lhes calhou em sorte, compreendo perfeitamente que o poeta assim sinta. Por isso mais valorizo a maneira extraordinariamente afável como todos me trataram, em que a alegria e a cordialidade parecem condição genética dominante partilhada por todos.


Uzee
Ujamu kitu kitamu tena ni azizi sana
Maungoni mwangu humu nilikuwa nao jana
Kwa wingi katika damu tahamaki leo sina
Nasikitika hadumu rafiki yangu ujana.


Kichwa kimejaa mvi kinywani meno hamna.
Nikenda kama mlevi miguu nguvu haina,
Kumbe ujana ni hivi ukenda hauji tena.
Nasikitika hadumu rafiki yangu ujana.


Jua langu limekuchwa na nyota niliziona.
Ukinitazama kichwa nywele nyeusi hakina,
Kama zilizofikchwa zikang'olewa mashina.
Nasikitika hadumu rafiki yangu ujana.


Natatizika kauli midomo najitafuna.
Nimekusanya adili walakini hali sina,
Dunia kitu bahili hiki una kile huna.
Nasikitika rafiki yangu ujana.


OLD AGE
Youth is a sweet thing, and it is so dear to us, here in my limbs
I too had it only yesterday, with plenty of blood, though today
no longer. Alas, it does not last, my good friend youth!

My hair is all grey, in my mouth there are no longer teeth,
I walk like a drunkard, my legs have no longer strength,
Now I see it, youth is like that, it goes and does not come back.
Alas, it does not last, my good friend youth!

My sun has set, and I can see the stars, when you look at
my head, you see no black hairs, as if they had been
wiped away, or pulled out roots and all
Alas, it does not last, my good friend youth!

I get confused in my words, I keep chewing on them,
I have collected wisdom, but my health is no good,
this life is a miserly thing, you get this but you don't get that.
Alas, it does not last, my good friend youth!

VELHICE
A juventude é uma coisa doce, tão querida para nós, senti-la nos membros
Eu também a tive em tempos, bem abundante de sangue, mas hoje
não a tenho mais. Infelizmente, não dura sempre, a boa e amiga juventude!

O meu cabelo tornou-se todo cinza, na minha boca não há já dentes,
Ando como um bêbado, as minhas pernas já não se aguentam firmes,
Agora vejo como as coisas são, a juventude é assim, vai e não volta.
Infelizmente, não dura sempre, a boa e amiga juventude!

O meu Sol se pôs, posso ver as estrelas, quando olhas para
a minha cabeça, não descobres cabelos negros, como se tivessem sido
eliminados, ou arrancados, com raiz e tudo.
Infelizmente, não dura sempre, a boa e amiga juventude!

Confundo-me com as palavras, mastigo-as continuamente,
Colecionei sabedoria, mas a minha saúde não é boa,
esta vida é uma coisa miserável, consegues isto, mas não consegues aquilo.
Infelizmente, não dura sempre, a boa e amiga juventude!

domingo, agosto 21, 2011

"Aula" aberta ao Pedro Luís Fonseca Matos


«Negros, asiáticos, brancos, somos todos parte da mesma comunidade. Por que temos de nos matar uns aos outros? Se querem perder o vosso filho, força. Senão, acalmem-se e vão para casa»

sol.sapo.pt
No meio dos distúrbios de Birmingham um homem apressa-se a socorrer as vítimas de um atropelamento, para descobrir que uma das três pessoas atropeladas é nada mais nada menos que o seu próprio filho.

13/8 às 9:54 · Privacidade: ·  ·  · 

    • Pedro Luis Fonseca Matos atençao sr professor desde os tempos das cavernas k os homens se matam uns aos outros está na genetica nada se pode fazer contra isso
      14/8 às 8:49 · 

    • Fernando Pinto 
      Pedro Luis Fonseca Matos, meu caro Pedro, felizmente, pode-se dizer, a própria genética contém dentro de si os mecanismos e os processos que conduzem ao melhoramento das espécies. Mas passando ao lado da questão da genética da agressividade: achas que este homem contrariou a genética?... Outra pergunta, mais direta: achas que ele não devia ter dito o que disse? Deve, a sua reação, ser para nós exemplo de alguma coisa? Um abraço, Pedro! ♥

      14/8 às 9:19 · 

Tantas aulas que os professores dão, tantas aulas que ficam por dar!
Às vezes pergunto-me se são mais as aulas que dou, ou as que imagino dar. Adiante. Se vou por aqui, se vou por este fio de conversa, corro o risco de ter o personagem do Ricardo Araújo Pereira a dizer-me acutilantemente: “Ele fala, fala, fala, mas não diz nada!...”
Ora vamos lá então a ver se digo qualquer coisa de jeito, no fundo, pensando que adoraria abordar este assunto, exatamente a partir da forma como surgiu no Facebook, numa das minhas aulas de Psicologia. Numa sala de aula, a gente tem mais tempo, podemos juntar mais esta ou aquele cereja à conversa, à explicação.
Vamos a isto!
É verdade, Pedro, desde o tempo das cavernas que os homens se matam uns aos outros.
É verdade, Pedro, isso está na genética.
Não é verdade, Pedro, que não se pode fazer nada contra isso. Não quero deixar de te dizer isto porque as coisas em que acreditamos, como eu costumo dizer nas aulas (nem é porque simplesmente o queira dizer, é porque o programa de Psicologia me obriga a dizer isso; e ainda bem que me obriga a fazê-lo, a mim e aos outros professores da disciplina),  influenciam a formação das nossas atitudes e das nossas opiniões; e aquelas e estas determinam os nossos comportamentos. Portanto, se a gente acredita que "não há nada a fazer", tem tendência a formar opiniões e a tomar decisões num sentido. Se, pelo contrário, a gente acredita  que "pode-se fazer alguma coisa", forma outras opiniões e toma outras decisões.
É verdade, Pedro, é legítimo acreditares na origem genética da agressividade humana (a que mata), os estudos sobre o desenvolvimento do cérebro humano mostram que a organização do nosso cérebro põe na base da sua própria evolução, nos primeiros grupos de células nervosas que o compõem, a força da agressividade. Corresponde à era, na história do desenvolvimento da espécie humana, da lei do mais forte. Quem é mais forte, manda; quem manda, mata se e quando quiser. E pode-se acrescentar, mata friamente.
Isto que acabo de te dizer, Pedro, tem a ver com uma teoria que começou por ser "apenas" muito sedutora no estudo da evolução do cérebro e dos comportamentos dos animais, especialmente do Homem, e que agora, para além da sedução, vem acumulando evidência científica. É a teoria do cérebro triuno de Paul MacLean. Hoje em dia é fácil encontrar na Internet sítios de divulgação desta teoria, que não é muito complicada. É a teoria do cérebro triuno que vai continuar a inspirar o que a seguir vou escrever; e que daqui a pouco associarei a um dos meus autores de eleição, como a generalidade dos meus alunos sabem, o austríaco pai da Etologia, Konrad Lorenz.
Continuando, a evolução do nosso cérebro é marcada pelo surgimento de uma segunda camada de massa cerebral (repara, Pedro, vem pôr-se por cima, digamos, do cérebro "original", mas não o elimina ou modifica), camada essa que traz a novidade da experiência afetiva e emocional que ajuda à regulação dos comportamentos. Esta nova camada, partilhamo-la essencialmente com os outros mamíferos. Uma das novidades da experiência emocional é a preocupação com o Outro, não apenas o Outro que é igual a mim, mas também o que é diferente (as outras espécies, sejam elas mais humanas, sejam elas mais animais). Ora bem, um dos efeitos do advento da experiência afetiva e emocional acontece precisamente sobre a fria força agressiva, competindo com ela e inibindo-a; regulando-a.
Como vês, Pedro, o próprio organismo humano, a própria evolução da nossa espécie, faz surgir dentro de si, diretamente a partir da sua condição biológica, a reação ao determinismo da agressividade, quer dizer, o organismo, ele próprio, encarrega-se de “fazer qualquer coisa contra isso”, sendo isso “os homens matarem-se uns aos outros”, inteiramente presos da condição genética de que falas.
Konrad Lorenz, partindo de uma outra perspetiva do estudo do comportamento humano, diz que, no fundo, as civilizações são as tentativas de resposta e reação dos grupos humanos ao determinismo da agressividade e do predomínio da lei do mais forte. Para isso, progressivamente, os grupos humanos organizaram rituais sociais e culturais que regulam as relações dos indivíduos nos grupos. Quando nós falamos nos rituais de passagem da adolescência, ora aí estão alguns exemplos daquilo que Konrad Lorenz fala. Não vou avançar por aqui (numa sala de aula certamente o faria, mas aqui, na Net, para já, tornaria a leitura deste texto fastidiosa), vou apenas dizer que, nos últimos anos da sua vida - Lorenz morreu em 1989 -, ele observava com telúrica tristeza o desmoronamento, o desaparecimento destes rituais, com o progressivo e imperial predomínio, nas sociedades humanas, dos valores economicistas e das motivações consumistas, cada vez mais egoístas e individualizadas.
Mas falta ainda uma camada no cérebro de MacLean. É a camada que corresponde, fisiologicamente, em linhas gerais, ao córtex cerebral, que é o “véu” que cobre todo o cérebro. Nesta última camada veio instalar-se a inteligência, a capacidade de pensar e de discernir; o sentido estético; e a sabedoria.
É o conjunto destas capacidades que nos permite, por exemplo, depois de termos visto esta madrugada a equipa de futebol portuguesa perder com a seleção do Brasil, na final do campeonato mundial de sub-20, dizermos: “Parabéns ao Brasil!”, quando estamos cheios de pena (cérebro emocional, a segunda camada de cérebro) de não termos visto os nossos jogadores ganharem o jogo; ou quando estamos cheios de raiva (cérebro agressivo, a primeira camada de cérebro) por aqueles “fedelhos” da equipa adversária terem vencido os nossos jogadores, os jogadores da nossa equipa.
Ao lado da tristeza (e / ou da raiva) de não vermos a equipa portuguesa ganhar a final de futebol, temos qualquer coisa que nos diz se o jogo foi bom ou não; que nos diz se o resultado é justo ou não; que nos diz se o jogo foi bonito ou não. Tudo isto são apreciações e julgamentos produzidos a partir da nossa última camada de cérebro.
Konrad Lorenz dizia: “Aparentemente, tanto a beleza do mundo cultural como a beleza do mundo natural são essenciais para manter o Homem espiritualmente são”. Quer dizer, a espécie humana tem "critérios de satisfação" que não são apenas de vencer ou ser vencido, de dominar ou não dominar o Outro.
Já agora, não te esqueças, Pedro: no fundo o jogo de futebol é exemplo de uma organização ritual de comportamentos humanos onde, com a presença de um árbitro, grupos “rivais” lutam, competem por uma coisa de que uns se aproprim à custa dos outros (a vitória, os pontos), mas sempre procurando regular a agressividade! É o tal “fair play”, entre os jogadores e os clubes.
Estás a ver, Pedro, porque é que a reação do pai que encontrou o seu filho morto pode ser considerado um hino ao fascinante desenvolvimento do cérebro e da espécie humana? Seguramente ele sentiu raiva; seguramente ele quis vingar a morte do filho (primeira camada do cérebro); seguramente ele sofreu o maior sofrimento do mundo que é a perda, fora de tempo, de um filho (segunda camada do cérebro); mas teve, na hora, a sabedoria para perceber o que estava em causa e o que poderiam ser as trágicas consequências para tantos iguais a ele, para tantos iguais ao filho querido e amado (terceira camada do cérebro).
Pedro, tens razão em tudo o que dizes, mas – por favor! – nunca mais digas que não há nada a fazer. Somos o raio de um bicho que tem deus e o diabo no corpo! Sejamos sempre capazes de fazer jus ao maravilhoso desenvolvimento humano, ao nosso desenvolvimento enquanto espécie (magnífica, fascinante... diabólica)!
Um grande abraço, Pedro, de muito amizade e carinho!

quarta-feira, agosto 10, 2011

Com a língua partilhamos a saudade, com a saudade partilhamos o destino e com o destino partilhamos a utopia.

O que tem estado a acontecer em Inglaterra (Reino Unido, eu sei, mas isso é mais para quem lá vive mesmo) é lamentável, muito lamentável. Os problemas sociais ganham forma de espetáculo de televisão e canais inserem na sua programação avisos de que vão fazer emissões especiais , diretamente de várias cidades inglesas, a partir das horas tais e tais, para que todos nós possamos ver, no descanso das nossas casas, os atos de violência e saque, e possamos exclamando, em tempo real, como agora se diz: Credo!... Ai que horror!... Que vândalos!... Meus Deus, onde é que este mundo vai parar!...
Hoje de manhã, pois claro, um dos canais generalistas da televisão portuguesa, apresentou imagens da noite que passou, mostrando várias cidades inglesas, focando bem o ferro e o fogo. Curiosamente, logo a seguir, no alinhamento do telejornal, veio o habitual noticiário dos movimentos de compra e venda nas principais bolsas europeias, notícias essas apresentadas com o tom de voz sempre monocórdico, de frases feitas, sempre iguais, absolutamente comuns a todos os canais que dão, todas as manhãs, informações sobre as ações que sobem, as ações que descem, os índices para cima, os índices para baixo.
No jogo que se sempre se joga nestas ocasiões, das causas próximas e das causas remotas deste tipo de acontecimentos, se calhar, sem querer, o canal de televisão em causa associou o efeito a uma das suas causas maiores, que nos mostra o estilo de vida dominante nas nossas sociedades: o movimento de capitais a pôr e a dispor das pessoas e das sociedades.
Repare-se no seguinte: os danos acumulados já devem chegar a valores que dariam para cobrir os orçamentos anuais dos centros de juventude que fecharam em Londres. Não estou a dizer que foi esta a causa precipitante, nem tão pouco que é a mais importante.
Não me canso de repetir o que o meu mestre João dos Santos muito sabiamente me repetiu, que, no fundo, o que importa na organização da vida das pessoas é a educação e a política. Ora, terão sido precisamente a educação e a política que falharam; que estão a falhar. Em Inglaterra e em todo o mundo.
Entre nós, portugueses, por exemplo, o grande desiderato da Educação é a melhoria dos resultados a Matemática, e quase se tem a vertigem de criar um deserto à volta dela, qual eucalipto voraz que absorve tudo avidamente.
Que sociedades, na história dos povos, conseguiu engrandecer com a desvalorização dos sábios da Educação, com a menorização dos seus professores?
É essa a desgraça dos tempos de hoje: os donos do dinheiro manietam os políticos, e os políticos desprezam os professores.
Curiosamente, também, na leitura matinal de hoje, li, precisamente depois de ver os noticiários:
"Podemos partilhar a saudade, entre todos os falantes da língua que se impôs como uma das maiores do mundo, veículo de muitas culturas, identidade comum. Pelo caminho houve muito sangue desperdiçado, muitos desastres ecológicos, muitos equívocos irreparáveis. Muitas pedras no meio do caminho. De todos esses desastres restam algures vestígios, uns indeléveis outros violentos, pelas veredas tortuosas que trouxeram até nós o poder de todas as paixões e a força de todas as utopias que se afeiçoam ao nosso destino. Com a língua partilhamos a saudade, com a saudade partilhamos o destino e com o destino partilhamos a utopia." (in Diário de Bordo, de António de Abreu Freire, apontamento de quinta-feira, dia 17 de maio de 2007, em Salvador da Bahia, no Brasil) 
A crise em que se inserem os acontecimentos de Inglaterra tem a ver, no meu entender, com o desprezo pelos valores da partilha, pelo deslaçamento das pessoas e dos grupos sociais, pela desistência das utopias coletivas. É o domínio absoluto do individualismo, casado, por intensa paixão, ao insaciável consumismo, que reclama satisfação imediata.
A responsabilidade última de tudo isto é sempre dos políticos e dos governantes.

quarta-feira, agosto 03, 2011

O ponto zero do urbanismo dos Olivais e de Chelas

A apresentação da lógica de desenho e construção dos bairros dos Olivais Norte, Olivais Sul e Chelas. É esta lógica que faz aparecer a Escola Secundária Eça de Queirós. A voz e as palavras são de dois dos principais arquitetos autores.
A ciência arquitetónica parece muita e de boa fé; a preocupação com as condições de vida das pessoas e a criação de espaços que possam juntá-las e protegê-las do tráfego automóvel também são evidentes.
Contudo, não há, em todo o vídeo, uma palavra sobre o espaço tal como ele era antes, as pessoas que ali habitavam, as formas culturais que caraterizavam aquelas zonas. Penso que, a quem vive agora nos Olivais, e que queira saber a história do chão que pisa, faz falta saber o que encontraram aqui quem tanto transformou o espaço dos Olivais e lhe deu as caraterísticas urbanísticas e arquitetónicas que agora tem.
No meu entender, assim sem mais, fica-se à mercê da acusação de puro imperialismo de gente autodeclarada como sábia e competente.
Onde estão as preocupações de conservar as marcas culturais dos locais, por mais pobres que sejam? Certamente existiram! Quais foram?... Como foram equacionadas? Como influenciaram no desenho do futuro bairro a construir? Fica-se à mercê de se pensar que se tratou de qualquer coisa deste género: "aqui não há ninguém... aqui não há nada... vamos fazer bairros dignos para pessoas que não estão cá e vamos trazer para cá". Como se houvesse a intenção de criar o ponto zero do urbanismo, quiçá mesmo da geografia dos Olivais.
Os Olivais, enquanto novo bairro, foram seguramente um desafio entusiasmante para quem desenhou as ruas, os passeios, as casas e os outros espaços de vida das gentes que moravam e moram nos Olivais.
Veja-se o que hoje existe de iniciativas, até de gente muito nova, para conservar - precisamente nos Olivais e em Chelas! - as marcas das suas identidades culturais locais. Devem-nos fazer - a todos - pensar no que se mexe e revolve com o enraizamento e o desenraizamento das pessoas. E a construção destes bairros - como tantas outras - terá feito isso: empurrou gente daqui para fora a trouxe gente de fora cá para dentro. Significativamente, muitos dos que já nasceram ou cresceram nos novos bairros de Chelas e Olivais também já temem que lhes aconteça o mesmo. Porque será?... Porque será que é tanta a preocupação e o esforço de conservar as construções da Praça da Viscondessa (que costumamos chamar Olivais Velhos)?
Curiosamente, as cidades modernas procuram recuperar, já não são sequer os "espaços verdes", é, isso sim, os espaços de terrenos, de espaços, individuais ou comunitários, precisamente no meio das cidades, para as pessoas cultivarem a terra e dela recolherem os produtos que ela dá para a alimentação do dia a dia. Tantas quintas que nos Olivais e em Chelas se deitaram abaixo!... Seriam quintas que valiam a pena?... Que histórias seriam as suas?...
Mais do que bota-abaixo, as impressões que acabo de escrever pretendem (e essa será a minha utopia) congregar os esforços de todos - começa a ser urgente fazê-lo - para juntar memórias e pensar o futuro. As fotografias do Arquivo Fotográfico de Lisboa que copiei para o meu Facebook mostram que há pessoas da fase anterior ao "ponto zero" que certamente ainda estão vivas. Que é feito dessas pessoas?... Que memórias têm dos Olivais e de Chelas?... O que lhes aconteceu depois do "ponto zero"?
Sinceramente, gosto do vídeo dos senhores arquitetos e já os ouvi pessoalmente falarem sobre os bairros dos Olivais e de Chelas. Por isso recomendo a todos que o vejam. Mas depois vamos fazer mais qualquer coisa! Que acham?
"A criação do Gabinete Técnico de Habitação (GTH) da Câmara Municipal de Lisboa ocorreu 
em 1959,  estando na origem da urbanização dos bairros sociais de Olivais Norte, Olivais Sul e Chelas. O GTH constituiu-se como um verdadeiro laboratório reformista, tanto nas opções de política urbana, como na visão técnica dos seus autores, através de operações de grande escala, inovadoras no quadro do urbanismo nacional. A intervenção maciça de arquitectos e outros técnicos no maior conjunto de habitação social até então planeado, abrangendo mais de 700 hectares e projectando albergar perto de 120 mil pessoas, constituiria uma escola de projecto doméstico colectivo e de integração de diferentes especialidades."

terça-feira, agosto 02, 2011

Mais informação, menos conhecimento

Este texto foi-me endereçado pela minha querida amiga Maria João Cordeiro, que tem mantido sempre uma sensibilidade muito arguta e e colaborante relativamente às minhas preocupações científicas e pedagógicas. Muito obrigado, João!
Não subscrevo integralmente as apreciações que o texto contém, nem do autor, nem das pessoas referidas no texto. Mas a reflexão de Mario Vargas Llosa tem o condão de ser clara e muito aberta, a deixar-se no ponto ótimo para induzir a discussão. Por mim, seguramente vou usá-lo, seja junto de alunos, de colegas professores e de pais.


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Por: Mario Vargas Llosa
Nicholas Carr estudió Literatura en Dartmouth College y en la Universidad de Harvard y todo indica que fue en su juventud un voraz lector de buenos libros. Luego, como le ocurrió a toda su generación, descubrió el ordenador, el Internet, los prodigios de la gran revolución informática de nuestro tiempo, y no sólo dedicó buena parte de su vida a valerse de todos los servicios online y a navegar mañana y tarde por la red; además, se hizo un profesional y un experto en las nuevas tecnologías de la comunicación sobre las que ha escrito extensamente en prestigiosas publicaciones de Estados Unidos e Inglaterra.
Un buen día descubrió que había dejado de ser un buen lector, y, casi casi, un lector. Su concentración se disipaba luego de una o dos páginas de un libro, y, sobre todo si aquello que leía era complejo y demandaba mucha atención y reflexión, surgía en su mente algo así como un recóndito rechazo a continuar con aquel empeño intelectual. Así lo cuenta: “Pierdo el sosiego y el hilo, empiezo a pensar qué otra cosa hacer. Me siento como si estuviese siempre arrastrando mi cerebro descentrado de vuelta al texto. La lectura profunda que solía venir naturalmente se ha convertido en un esfuerzo”.
Preocupado, tomó una decisión radical. A finales de 2007, él y su esposa abandonaron sus ultramodernas instalaciones de Boston y se fueron a vivir a una cabaña de las montañas de Colorado, donde no había telefonía móvil y el Internet llegaba tarde, mal y nunca. Allí, a lo largo de dos años, escribió el polémico libro que lo ha hecho famoso. Se titula en inglés The Shallows: What the Internet is Doing to Our Brains y, en español: Superficiales: ¿Qué está haciendo Internet con nuestras mentes? (Taurus, 2011). Lo acabo de leer, de un tirón, y he quedado fascinado, asustado y entristecido.
Carr no es un renegado de la informática, no se ha vuelto un ludita contemporáneo que quisiera acabar con todas las computadoras, ni mucho menos. En su libro reconoce la extraordinaria aportación que servicios como el de Google, Twitter, Facebook o Skype prestan a la información y a la comunicación, el tiempo que ahorran, la facilidad con que una inmensa cantidad de seres humanos pueden compartir experiencias, los beneficios que todo esto acarrea a las empresas, a la investigación científica y al desarrollo económico de las naciones.
Pero todo esto tiene un precio y, en última instancia, significará una transformación tan grande en nuestra vida cultural y en la manera de operar del cerebro humano como lo fue el descubrimiento de la imprenta por Johannes Gutenberg en el siglo XV que generalizó la lectura de libros, hasta entonces confinada en una minoría insignificante de clérigos, intelectuales y aristócratas. El libro de Carr es una reivindicación de las teorías del ahora olvidado Marshall McLuhan, a quien nadie hizo mucho caso cuando, hace más de medio siglo, aseguró que los medios no son nunca meros vehículos de un contenido, que ejercen una solapada influencia sobre éste, y que, a largo plazo, modifican nuestra manera de pensar y de actuar. McLuhan se refería sobre todo a la televisión, pero la argumentación del libro de Carr y los abundantes experimentos y testimonios que cita en su apoyo indican que semejante tesis alcanza una extraordinaria actualidad relacionada con el mundo del Internet.
Los defensores recalcitrantes del software alegan que se trata de una herramienta y que está al servicio de quien la usa y, desde luego, hay abundantes experimentos que parecen corroborarlo, siempre y cuando estas pruebas se efectúen en el campo de acción en el que los beneficios de aquella tecnología son indiscutibles: ¿quién podría negar que es un avance casi milagroso que, ahora, en pocos segundos, haciendo un pequeño clic con el ratón, un internauta recabe una información que hace pocos años le exigía semanas o meses de consultas en bibliotecas y a especialistas? Pero también hay pruebas concluyentes de que, cuando la memoria de una persona deja de ejercitarse porque para ello cuenta con el archivo infinito que pone a su alcance un ordenador, se entumece y debilita como los músculos que dejan de usarse.
No es verdad que el Internet sea sólo una herramienta. Es un utensilio que pasa a ser una prolongación de nuestro propio cuerpo, de nuestro propio cerebro, el que, también, de una manera discreta, se va adaptando poco a poco a ese nuevo sistema de informarse y de pensar, renunciando poco a poco a las funciones que este sistema hace por él y, a veces, mejor que él. No es una metáfora poética decir que la “inteligencia artificial” que está a su servicio, soborna y sensualiza a nuestros órganos pensantes, los que se van volviendo, de manera paulatina, dependientes de aquellas herramientas, y, por fin, en sus esclavos. ¿Para qué mantener fresca y activa la memoria si toda ella está almacenada en algo que un programador de sistemas ha llamado “la mejor y más grande biblioteca del mundo”? ¿Y para qué aguzar la atención si pulsando las teclas adecuadas los recuerdos que necesito vienen a mí, resucitados por esas diligentes máquinas?
No es extraño, por eso, que algunos fanáticos de la Web, como el profesor Joe O’Shea, filósofo de la Universidad de Florida, afirme: “Sentarse y leer un libro de cabo a rabo no tiene sentido. No es un buen uso de mi tiempo, ya que puedo tener toda la información que quiera con mayor rapidez a través de la Web. Cuando uno se vuelve un cazador experimentado en Internet, los libros son superfluos”. Lo atroz de esta frase no es la afirmación final, sino que el filósofo de marras crea que uno lee libros sólo para “informarse”. Es uno de los estragos que puede causar la adicción frenética a la pantallita. De ahí, la patética confesión de la doctora Katherine Hayles, profesora de Literatura de la Universidad de Duke: “Ya no puedo conseguir que mis alumnos lean libros enteros”.
Esos alumnos no tienen la culpa de ser ahora incapaces de leer La Guerra y la Paz o el Quijote. Acostumbrados a picotear información en sus computadoras, sin tener necesidad de hacer prolongados esfuerzos de concentración, han ido perdiendo el hábito y hasta la facultad de hacerlo, y han sido condicionados para contentarse con ese mariposeo cognitivo a que los acostumbra la red, con sus infinitas conexiones y saltos hacia añadidos y complementos, de modo que han quedado en cierta forma vacunados contra el tipo de atención, reflexión, paciencia y prolongado abandono a aquello que se lee, y que es la única manera de leer, gozando, la gran literatura. Pero no creo que sea sólo la literatura a la que el Internet vuelve superflua: toda obra de creación gratuita, no subordinada a la utilización pragmática, queda fuera del tipo de conocimiento y cultura que propicia la Web. Sin duda que ésta almacenará con facilidad a Proust, Homero, Popper y Platón, pero difícilmente sus obras tendrán muchos lectores. ¿Para qué tomarse el trabajo de leerlas si en Google puedo encontrar síntesis sencillas, claras y amenas de lo que inventaron en esos farragosos librotes que leían los lectores prehistóricos?
La revolución de la información está lejos de haber concluido. Por el contrario, en este dominio cada día surgen nuevas posibilidades, logros, y lo imposible retrocede velozmente. ¿Debemos alegrarnos? Si el género de cultura que está reemplazando a la antigua nos parece un progreso, sin duda sí. Pero debemos inquietarnos si ese progreso significa aquello que un erudito estudioso de los efectos del Internet en nuestro cerebro y en nuestras costumbres, Van Nimwegen, dedujo luego de uno de sus experimentos: que confiar a los ordenadores la solución de todos los problemas cognitivos reduce “la capacidad de nuestros cerebros para construir estructuras estables de conocimientos”. En otras palabras: cuanto más inteligente sea nuestro ordenador, más tontos seremos.
Tal vez haya exageraciones en el libro de Nicholas Carr, como ocurre siempre con los argumentos que defienden tesis controvertidas. Yo carezco de los conocimientos neurológicos y de informática para juzgar hasta qué punto son confiables las pruebas y experimentos científicos que describe en su libro. Pero éste me da la impresión de ser riguroso y sensato, un llamado de atención que –para qué engañarnos– no será escuchado. Lo que significa, si él tiene razón, que la robotización de una humanidad organizada en función de la “inteligencia artificial” es imparable. A menos, claro, que un cataclismo nuclear, por obra de un accidente o una acción terrorista, nos regrese a las cavernas. Habría que empezar de nuevo, entonces, y a ver si esta segunda vez lo hacemos mejor.