ESPLENDOR E SOMBRA SOBRE A EUROPA, 9/12
«Chegado o último ano do velho século [está a falar do séc. XIX], chegou também o momento, há tanto tempo esperado, em que pudemos fechar atrás de nós a porta do odiado liceu»(1),Stefan Zweig, umas páginas mais à frente, escreve:
«numa época em que tudo se absorve, onde é fácil estabelecer amizades e em que as diferenças sociais ou políticas ainda não estão anquilosadas, um jovem aprende realmente melhor o que é essencial no contacto com os que com ele se esforçam por avançar, do que com os superiores.»(2)O trágico autor, aos poucos, toma consciência das turbulências interiores que o atraem e lhe pedem toda a dedicação pessoal que consiga:
«[…] No meu íntimo, era agora claro qual o caminho a seguir nos anos que aí vinham; ver muito, aprender muito, e só depois começar de verdade!
[…] Talvez seja necessário fazer aqui um pequeno esclarecimento. A nossa época vive demasiado depressa um número excessivo de acontecimentos para conseguir manter deles uma memória fiel e não sei se o nome Emile Verhaeren ainda significa alguma coisa nos dias que correm. Verhaeren tinha sido o primeiro de todos os poetas franceses a tentar dar à Europa o que Walt Whitman deu à América: uma profissão de fé no seu tempo, uma profissão de fé no futuro. Começara a amar o mundo e queria conquistá-lo para a poesia. Enquanto que, para os outros, a máquina era o mal, as cidades eram o feio, o presente era a antipoesia, ele entusiasmava-se com cada nova descoberta, com cada feito da técnica e entusiasmava-se com o seu próprio entusiasmo, entusiasmava-se com plena consciência, para melhor sentir essa paixão. Os poemas iniciais deram origem a grandes hinos caudalosos. “Admirez-vous les uns les utres» era a sua sigla para os povos da Europa. Todo o optimismo da nossa geração, um optimismo que há muito se tornou incompreensível para a época de terrível regressão que hoje estamos a viver, encontrou nele a primeira expressão poética, e alguns dos seus melhores poemas ainda serão por muito tempo o testemunho da Europa e da humanidade com que então sonhávamos. »(3)Que concluirão jovens adultos, quais adolescentes peregrinos, mendigos, arrimados ao cajado, agora, pouco mais de 100 anos depois, com as realidades dramáticas e esperançosas que o século que passou lhes mostra? Sim, o desafio é grande - e não pede senão dedicação.
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(1) “O Mundo de Ontem, recordações de um europeu”, de Stefan Zweig (1942), publicado pela Assírio & Alvim, reimpressão de 2017, p. 118.
(2) “O Mundo de Ontem, recordações de um europeu”, de Stefan Zweig (1942), publicado pela Assírio & Alvim, reimpressão de 2017, p. 145.
(3) “O Mundo de Ontem, recordações de um europeu”, de Stefan Zweig (1942), publicado pela Assírio & Alvim, reimpressão de 2017, pp. 149-50.