sexta-feira, julho 20, 2018

O altruísmo é natural nas crianças. É, pois é. E depois?

Continuam em alta os estudos acerca do altruísmo e da compaixão - em todas as idades; com sofisticados estudos cheios de neuro-imagens; e muitas comparações entre culturas.
«As crianças pequenas ajudam espontaneamente», afirma a investigação experimental sistemática. Crianças pequenas são, 'grosso modo', as que têm 2 anos de idade; mas a investigação já detecta comportamentos altruístas aos 14 meses.
https://www.nytimes.com/2009/12/01/science/01human.html
Ainda há poucos dias aqui escrevi que, na minha opinião, a questão não é se o ser humano é naturalmente, e primariamente, bom ou mau; ou altruísta, ou compassivo, ou solidário.
E o foco na "ajuda" também me parece limitar o valor do que essencialmente está em causa. Para ser claro, mais do querer ajudar, a criança quer participar; participar ao lado dos outros, e com os outros..
As crianças apercebem-se, logo que despertam para o mundo (e as teorias do desenvolvimento sócio-afectivo voltam a situar por volta do ano e meio, dois anos, a consciência da vontade pessoal e do bem assumido "Não!" pela criança, em afirmação da sua própria vontade, em oposição à do adulto), que andamos por aqui todos (menos grandes e mais mais grandes), que elas têm de crescer, e que a vida dos adultos será um dia a delas. Naturalmente, as crianças querem fazer o que as outras pessoas todas à sua volta fazem; e as crianças fazem-nos com alegria e empenho. Portanto, as crianças querem, antes de mais, participar na Vida; e a vida está impregnada de adultos que fazem coisas. Se, em razão dessa natural participação na vida em comum com os outros, constatar que é preciso ajudar algum adulto, a criança, voluntariosamente, tenta ajudar.
Pensando desta maneira, a questão não será "São as crianças naturalmente altruístas?", mas sim "Por que razão as crianças se tornam cada vez menos altruístas?" Ora bem, responder a esta pergunta é comprometer os adultos.
Eu já disse, e repito-o, que a questão-chave é a da Educação.
Como deve ser, então, a educação do altruísmo, sobretudo tendo em conta que este precioso valor-motivador do comportamento corre fortemente o risco de ser vencido, ao longo da vida, pelo valor da competição entre os indivíduos e entre os grupos? Nos pódios, só há lugar para o outro, de ouro, prata e bronze - só mesmo três; e até o ideal olímpico exorta o "mais rápido, mais alto, mais forte"... que os outros! Mesmo que insista que o jeito e o espírito sejam o da competição saudável.
Ora bem, como a criança, antes de mais, faz o que vê o adulto fazer, a primeira forma de educação tem de ser o próprio exemplo do adulto. Quer dizer, a criança naturalmente, participa na vida do adulto, e ajuda-o. Naturalmente, também, a criança toma consciência de que tem desejos, tornando-se, por isso, (mais um) ser portador de desejos. Que nunca se negue que as crianças criam desejos!, alguns iguais aos dos adultos, e outros diferentes.
Na minha opinião, a chave da Educação do Altruísmo e do Desejo é uma, e é radical: a renúncia. Provavelmente, o Presidente José Mujica diria "a sobriedade do desejo" - é que renúncia, mais do que recusa ou negação total, quer dizer, no meu entender, contenção viável. Com os adultos, as crianças têm de aprender os exemplos do altruísmo e da contenção dos desejos. O altruísmo não se explica com textos, sejam eles servidos por sofisticadas ilustrações ou recomendações de boa exploração em sala de aula. O altruísmo faz-se, vive-se, todos os dias, em todos os momentos; e a sobriedade dos desejos também.

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